A história política e social que Portugal conheceu nos anos 70 fez com que a ideia de uma cultura jovem, que noutras paragens do mundo ocidental viveu intensamente as expressões de ambiguidade do glam rock, os ares de libertação do disco sound ou as brisas de revolução do punk não fossem exatamente vividas nem da mesma maneira, nem ao mesmo tempo nem com a mesma intensidade. Apesar do impacte do disco na cena noturna de então, a equação do sucesso popluar no Portugal de 1977 não era necessariamente nem pop… nem muito jovem (coisa que só chegaria com o “boom” de entusiasmos que, em 1980, viu gente da mesma idade a trabalhar em editoras, a fazer rádio e televisão, a criar nova música e a querer escutá-la). Em 1977, mesmo assim, o retrato do que era sucesso não vivia de costas voltadas para com o que acontecia tanto que dois dos cinco singles mais populares do ano acabaram retratados na compilação de sucessos que a PolyGram editou com o título Festival Polystar 77. I Feel Love de Donna Summer e Ma Baker dos Boney M não só asseguram aqui duas das três fatias de disco sound do alinhamento (a terceira cabe a Love Me Baby de Sheila B. Devotion, canção que não resistiu da mesma forma à erosão do tempo), como representam, das 16 faixas deste LP, as que se alinham mais perto do que foi, nesse ano, o consumo mainstream à escala global.

            Tal como no Jackpot de 1979 de que aqui falava há dias (ver aqui), este Festival Polystar 77 é uma clara expressão do que era sucesso de vendas de discos (e de airplay na rádio) num tempo em que o público mais jovem não só não representava uma força de mercado tão evidente – fruto de uma economia ainda frágil – como era realidade mediaticamente pouco representada. O sucesso popular era assim definido por um público mais velho, ficando assim longe deste patamar algumas expressões da cultura pop/rock de então que eram conhecidas e vividas entre melómanos e públicos universitários, mas que não alcançavam um mediatismo ou volume de vendas de discos suficientemente capaz de lhes atribuir um estatuto de êxito.

            O “sucesso” em 1977 cabia, segundo o Festival Polystar 77, a grandes nomes da canção ligeira internacional como Demis Roussos (Mourir Aupres de Mon Amour), Art Sullivan (Leanna) ou Timothy (Lady Love). O Festival da Eurovisão estava aqui representado com três canções: Mathema Solfege de Pacalis, Mariana, Robert & Bessy (Grécia), Rock Bottom de Lindsay de Paul & Mike Moran (Reino Unido) e a vencedora Marie Myriam com L’Oiseau et L’Enfant (França). A música portuguesa surge aqui por dois nomes habitués do Festival da Canção, porém com canções que não passaram pelo concurso: José Cid (A Anita Não é Bonita, que cruza folclore e disco) e os Gemini (Uma Flor à Janela).

            O espaço da popularidade conquistada pela televisão notava-se na presença da Modinha para Gabriela de Gal Costa (tema do genérico da primeira novela da Globo transmitida pela RTP). E do universo dos musicais de palco chegava uma versão de Don’t Cry For Me Argentina, na voz de Julie Convington, a primeira atriz e cantora a assumir o papel, na versão estreada em 1976). O que “sobra” no alinhamento cabe de facto ao universo pop/rock, mas longe de traduzir o entusiasmo “juvenil” do ano do Heroes de Bowie ou de God Save The Queen dos Sex Pistols. Nada disso… O retrato pop/rock aqui faz-se por via mais conservadora através de Old Schoolyard de Cat Stevens, Music de John Miles e do já veterano Unchained Melody dos Righteous Brothers, então a viver uma das suas sete vidas (desta vez tendo por motivo o facto de Elvis a ter cantado no seu último show de TV e de o original ter voltado a passar nas rádios logo a seguir). Era o que tínhamos…

Respostas de 2 a “Vários Artistas “Festival Polystar 77” (1977)”

  1. O alinhamento parece-me bastante diverso.Interessante o facto de aparecerem por aqui temas licenciados a outras editoras. Basta ver a contracapa no discogs para reparar por exemplo em José Cid (Arnaldo trindade) ou John Miles (Valentim de C).

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  2. A editora é ainda a Phonogram pois mudou para Polygram em Dezembro de 1978. (cf. editoraspt blogspot com)

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