Editado em 1982, o álbum “Quartet” encerrou uma importante etapa no percurso dos Ultravox, dando-lhes um dos seus discos mais memoráveis. O álbum acaba de conhecer uma reedição com vários conteúdos de arquivo até aqui ainda inéditos. Texto: Nuno Galopim

Formados em meados dos anos 70, procuravam rotas diferentes face ao que então a contemporânea revolução punk colocava em marcha. Trabalharam com Brian Eno num primeiro álbum, depois com Steve Lillywhite, encontrando um novo rumo por alturas do segundo um álbum, que abre pontualmente um caminho focado em diálogos  entre as guitarras e as (emergentes) electrónicas, trilho que exploraram mais profundamente logo a seguir em “Systems of Romance” (ainda em 1978), que gravam com produção de Conny Plank, figura referencial do krautrock e que, entre finais dos anos 70 e a alvorada dos 80 surge ao lado de várias bandas que então entravam em cena rotuladas como new wave. A falta de resultados fez com que a editora colocasse um ponto final no relacionamento com o grupo. A saída do vocalista (John Foxx, que encetaria carreira a solo) e do guitarrista deixam assim o núcleo dos Ultravox – Billy Currie (teclas), Chris Cross (baixo) e Warren Cann (bateria) – sem um futuro nítido pela sua frente. Cann colaborou então em sessões dos Buggles, Cross participou em concertos de outros músicos e Currie foi chamado a estúdio por Gary Numan e também pelo projeto Visage (de Steve Strange e Rusty Egan, figuras da noite londrina que então teciam as ideias do que em breve seria a vaga new romantic). É aí, nos Visage, que conhece Midge Ure, cantora e guitarrista que aceita juntar-se aos Ultravox, iniciando uma segunda etapa, nascendo então aquela que acabaria conhecida como a formação “clássica” do grupo. Os dois primeiros álbuns que gravam – “Vienna” (1980) e “Rage in Eden” (1981) – retomam o contacto com Conny Plank, e aprofundam o trabalho de ligação das heranças pop/rock às potencialidades melódicas e cénicas (chamavam-lhe “atmosféricas”) dos sintelizadores. O contexto de época, a imagem que adotam e a eventual ligação aos Visage acaba até por associá-los à vaga new romantic, tendo assim representado a banda com mais ambições arty do “movimento”. O sucesso de “Vienna”, confirmado depois com o mais intenso, mas austero, “Rage in Eden”, deu-lhes estatuto e, à editora, confiança. E na hora de procurar mais um episódio não baixaram a bitola da ambição: queriam ter George Martin como produtor. Queriam e tiveram, nascendo assim “Quartet”, sexto álbum que editaram em 1982, dele tendo sido extraídos quatro singles com sucesso considerável em diversos territórios europeus: “Reap The Wild Wind”, “Hymn”, “Visions in Blue” e “We Came To Dance”, definindo um arco de tempo que conheceria conclusão no álbum ao vivo “Monumento (The Soundtrsck)”, editado em 1983, documento da digressão que então acompanhou o lançamento do álbum.

Apesar da novidade em cena – ou seja, o produtor – na verdade “Quartet” não pretende escapar aos vetores definidos nos álbuns anteriores, tanto que acaba por completar o ciclo iniciado em 1978 com um conjunto de novas canções bem estruturadas, facto que em parte poderá decorrer de um método de trabalho novo, evitando a criação a partir do zero em estúdio, obrigando o grupo a sessões de escrita, seleção e moldagem, antes da etapa de gravação propriamente dita. Uma certa dimensão mística, sugerida pelos títulos de algumas canções, eleva contudo as visões cénicas a um patamar mais ambicioso, que de resto a capa de Peter Saville e sua a própria materialização tanto no teledisco de “Reap The Wild Wind” como no palco sublinhariam. Esta dimensão a piscar o olho a tonalidades épicas ditaria, de resto, o rumo a seguir no álbum seguinte, “Lament” (1984), onde ganharia forma uma versão mais amaciada de algumas das linhas levantadas por parte das canções de “Quartet” e que representaria o último momento de grande impacte comercial levantado por álbuns de estúdio dos Ultravox. 

“Quartet”, que dá aos Ultravox o seu primeiro momento de sucesso nos EUA (com o single de avanço “Reap The Wild Wind”) conhece agora uma reedição feita exatamente nos mesmos moldes das que, em anos recentes, deram novas vidas aos álbuns “Vienna” e “Rage in Eden”. O álbum é apresentado numa versão remasterizada, surgindo depois como novo ponto de vista uma remistura assinada por Steve Wilson (que não é particularmente consequente nem reveladora de nada que a visão trabalhada com George Martin não tivesse ponderado em 1982, valorizando talvez um pouco mais sabores das electrónicas e músculo rítmico). Servem-se os lados B da época e as versões dos singles e máxis (gravações já disponíveis em reedições em CD e até mesmo, no caso dos B sides, na antologia “Rare 1”, de 1993). As novidades mais apetitosas desta reedição são um volume expressivo de maquetes de ensaios (em várias etapas de evolução das canções, documentando o processo criativo) e a inclusão da gravação do concerto captado no Hammersmith Odeon em 1982, muito certamente o mesmo do qual parte foi usada no álbum ao vivo de 1983 e na respetiva versão alargada (mas então ainda não integral) lançada em CD em 2009. Os conteúdos das edições especiais em CD e LP diferem entre si. A caixa em CD inclui todas estas gravações mais um booklet de 20 páginas e uma reprodução do programa da digressão. A caixa com os LP em vinil inclui apenas o álbum original, os lados B, as remisturas e o concerto ao vivo (que ocupa dois discos). Há ainda um 2LP com o disco original e, no LP2, uma seleção de lados B, remisturas e faixas ao vivo. O picture disc reproduz a versão original feita a partir do master analógico de 1982. 

“Quartet – 40th Anniversary Edition”, dos Ultravox, está disponível em 5CD + DVD Audio, 4 LP, 2 LP e Picture disc e nas plataformas digitais, numa edição da Chrysalis.

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

Trending