John Grant, Craig Armstrong, Fontaines DC, Camille, Let’s Eat Grandma, Ben Harper, John Parish, Liz Pahair ou Meshell Ndegeocello são alguns dos nomes que encontramos no disco de tributo “The Endless Coloured Ways: The Songs Of Nick Drake”. Texto: Nuno Galopim

Joel Federiksen estava um dia numa sala de cinema quando, antes do filme, um dos anúncios apresentou um automóvel ao som de “Pink Moon” de Nick Drake (1948-1974). Cantor (um baixo, mais concretamente) e também alaudista, o músico alemão conhecia a música do cantautor britânico há já alguns anos, antes mesmo das redescobertas que começaram a ganhar fôlego com novas edições e reedições depois dos anos 90. Mas naquela noite, ao escutá-lo numa sala de cinema, a antiga paixão ganhou outro sentido e a ideia de trabalhar aquelas canções tomou fôlego, acabando por se transformar em “Requiem For a Pink Moon”, disco editado em 2012 pela Harmoinia Mundi, no qual uma voz habitualmente dedicada à música antiga, acompanhada pelo alaúde e outros instrumentos frequentemente associados a essas memórias mais remotas, reinventavam, de forma invulgar, as canções de Nick Drake. Este álbum, lançado há pouco mais de uma década, é apenas um entre os muitos exemplos de ocasiões em que, depois do quase silêncio que conhecera em vida, a música Nick Drake ganhou novas abordagens e manifestações de admiração, processo que na verdade só começou a ganhar forma depois de elogios por figuras como Kate Bush ou os Dream Academy, juntamente com a entrada em cena de compilações como “Heaven in a Wild Flower – An Exploration of Nick Drake” (1985) ou “Way To Blue” (1994) que, juntamente com o disco póstumo de inéditos “Time of No Reply” (1986) e as reedições em CD dos seus três álbuns de estúdio em 1987, criando momentos que geraram uma postura da imprensa musical bem distinta do quase alheamento de outrora. Nick Drake acabou por conquistar o merecido lugar no Olimpo dos grandes cantadores. E, tal como Joel Federiksen, muitos músicos, das mais variadas variadas geografias do som e oriundos dos mais diversos lugares, têm vindo a criar, ao longo dos anos, inúmeras novas abordagens a canções, algumas delas de facto com aquela rara capacidade de resistir ao tempo e de ganhar novas vidas que lhes atribui o estatuto de “standard”. 

Com efeito, apesar de praticamente ignorado em vida, Nick Drake hoje é indubitavelmente reconhecido como autor de uma das mais belas, pessoais e influentes obras da história da música popular, apesar da relativamente curta obra e breve existência. Mais que uma mera figura de culto, Nick Drake é um ícone de referência, um autor único no seu trabalho de composição, muito pessoal abordagem ao dedilhar da guitarra, um eloquente e literato escritor de canções, dono de uma voz arrepiantemente bela. E, no fim, conhecida a história de que, como cantava em “Fruit Tree”, quase parecia ter a consciência premonitória de que o seu tempo ou seria curto ou o seu reconhecimento, a acontecer, chegaria como coisa tardia, encarna nas canções que fez e gravou uma dimensão verdadeiramente trágica que assombra, mas não deixa de encantar. Nick Drake é um autor agora venerado entre músicos e melómanos, tendo a sua obra semeado uma descendência que finalmente floriu. Veja-se o exemplo do cantor e alaudista Joel Fredrokssen em “Requiem For A Pink Moon”. Ou, editado em 2013, Way To Blue – The Songs of Nick Drake”, disco de tributo que tem na génese. Apresenta destacada de Joe Boyd, o mesmo produtor que acompanhou o músico em estúdio nos seus dois primeiros álbuns (“Five Leaves Left” e “Bryter Later”) e cuja ausência o próprio Drake sentiu no terceiro (“Pink Moon”), e onde surgiam contribuições de nomes como os de Vashty Bunyan, Green Gartside (dos Scritti Politti), Teddy Thompson, Robyn Hitchcock ou Scott Mathews, entre outros, chamando ainda as presenças de músicos como o baixista Danny Thompson (ex-Pentangle), que chegou a gravar com Nick Drake, ou o guitarrista Neill MacColl (que teve a braços a difícil tarefa de abordar o raro dedilhar do homenageado).

Agora, neste 2023 que assinala a passagem de 75 anos sobre o nascimento de Nick Drake, e assiste à publicação de uma detalhada biografia assinada por Richard Morton Jack, entra em cena “The Endless Coloured Ways: The Songs Of Nick Drake”, um novo tributo com produção de grande fôlego, juntando mais de 30 artistas em volta das suas canções. Nomes como os de John Grant, Craig Armstrong, Fontaines DC, Camille, Let’s Eat Grandma, Ben Harper, John Parish, Aldous Harding, Liz Pahair, Meshell Ndegeocello ou os Bombay Bicycle Club, entre muitos mais, dividem entre si peças de um repertório por todos eles admirado, encontrando rotas e destinos bem distintos entre si, comprovando de facto as raras qualidades de canções que podem, como nem todas, desencadear novos estímulos e navegar por caminhos bem diferentes dos berços onde nasceram. Como em qualquer tributo a visão conjunta das versões traduz resultados desiguais, cabendo ao gosto de cada ouvinte encontrar ali as melhores surpresas, os encantamentos. Pela diversidade e volume de abordagens este é certamente um tributo a ganhar lugar de referência entre as descendências da obra de Nick Drake. Mas confesso que, chegado ao fim, apesar de uma mão cheia de bons momentos, não mora aqui um título para colocar ao lado de um “I’m Your Fan” (Leonard Cohen) ou “Red Hot + Blue” (Cole Porter), ou seja, aqueles tributos que fizeram história pelas qualidades das novas versões e do conjunto por si gerado e não as ressonâncias naturais do peso do nome homenageado. Mais do que a música em si, o modelo de edição deste álbum, que além da edição nos suportes habituais gerou, antes, um countdown com vários lançamentos em singles, abrindo progressivas janelas de comunicação, é característica a reter na história (longe de concluída) dos discos de tributo. 

“The Endless Coloured Ways: The Songs Of Nick Drake”, que envolve vários artistas, é uma edição em 2LP, CD e nas plataformas digitais, numa edição Chrysalis Records / Cargo

Uma resposta a “Vários artistas “The Endless Coloured Ways: The Songs Of Nick Drake””

  1. […] o que seria o 70º aniversário do músico. Tributos também já se avolumam, o mais recente deles, “The Endless Coloured Ways: The Songs Of Nick Drake”, tendo surgido em 2023. Na verdade, e depois de apresentado o excelente  “Remembered For a […]

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