Não foram certamentre muitos os que deram conta do lançamento de “Fanfarre For The Comic Muse”, o álbum de 1990 que colocava em cena a figura e a voz de Neil Hannon, desde logo apresentando-se não como artista a solo mas através da designação Divine Comedy, banda na qual o único elemento fixo é, desde então, ele mesmo. A quase invisibilidade desse disco, que o próprio Hannon inclusivamente poucas vezes refere, fez com que, em agosto de 1993, a chegada de “Liberator” se fizesse com aquele sabor de surpresa que tantas vezes associamos a uma boa descoberta.

Há de facto evidentes diferenças entre as canções gravadas em “Fanfarre For The Comic Muse” e “Liberator”, aqui aflorando não apenas o retratista do universo (das ilhas britânicas) ao seu redor, na melhor tradição do que antes havíamos escutado nuns Kinks ou XTC e o autor moldado pela literatura, inclusivamente com referências a Scott Fitzgerald, Anton Chekov, E.M. Forster ou William Wordsworth de quem, de resto, “Lucy” assimila palavras suas. Ao mesmo tempo o disco afirma Neil Hannon como maestro sedento de uma visão elaborada para os arranjos (por vezes houve quem usasse o termo ‘barroco’), na qual as canções tanto podiam ser moldadas por linguagens mais habituais em terreno pop como através do recurso a instrumentos então menos frequentes por aqueles lados, como o cravo, metais ou cordas. 

Nasceu assim um álbum que aliou as qualidades de uma escrita observadora e bem humorada (por vezes sarcástica) a uma música desafiante, tão moderna quanto clássica, com cereja sobre o bolo na forma de uma interpretação vocal segura e marcante, que desde logo guardou lugar, num eventual futuro ‘bem of’ dos Divine Comedy, para canções como “The Pop Singer’s Fear of The Pollen Count” ou o irresistível “Europop”. 

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