Se há figura “à espera” de um valente biopic entre os nomes de proa da música francesa ele é Michel Polnareff. A mãe era bailarina e o pai, natural de Odessa, combateu pela resistência francesa durante a II Guerra Mundial e depois criou canções para nomes como Edith Piaf, Moloudji ou Yves Montand. Em casa só tinha “autorização” para escutar música clássica e inevitavelmente acabou a estudar música. Ao sair de casa começou por trabalhar num banco, depois numa seguradora… Até que começou a atuar nas escadas em frente ao Sacré Coeur e, aderindo aos ideais beatnick, começa a focar cada vez mais atenções na música.

Vence um concurso (que lhe daria um contrato pela poderosa Barclay), mas recusa o prémio temendo ser manipulado. Pouco depois acaba contudo a aceitar gravar pela Disc AZ, sugerindo como condição gravar o disco de estreia em Londres, onde conta em estúdio com as contribuições de Jimmy Page e John Paul Jones (que em breve formariam os Led Zeppelin). Do álbum de estreia, editado em 1966, nasce o single “La Poupée Qui Fait Non”, que se torna um sucesso instantâneo. Durante os anos seguintes, vincando o potencial de um look que piscava o olho à transgressão das normas identitárias da moral vigente (antes de Bowie, portanto), ensaiando também outras expressões de ousadia nos comportamentos que não muito distantes das que faziam notícias com Serge Gainsbourg, criou um corpo de canções e um estatuto que o colocaram na linha da frente da cena pop/rock local, mostrando as canções, contudo, uma visão cénica de vistas largas, pelas quais passavam heranças da chanson e de estímulos que o seu percurso de vida fora colhendo.

A um período de triunfos sucede-se, em 1973, um episódio dramático quando descobre que está financeiramente arruinado e carregado de dívidas fiscais. Depois de um episódio de depressão ruma aos EUA, onde vive num período inicial durante quatro anos, seguindo-se etapas de trabalho divididas entre ambos os países. Um renascimento das atenções num patamar de visibilidade maior começa a desenhar-se nos anos 90, com expressões de admiração reforçadas já no século XXI…Tudo isto mais toda uma dimensão pessoal, os problemas de visão, os colaboradores e admiradores… Só falta o filme, pois.

Enquanto não há filme as várias biografias já publicadas e as muitas versões já criadas para as suas canções vão juntando exemplos de reconhecimento a uma figura invulgar e marcante. Em 1999, ciente deste estatuto e do potencial de comunicação da obra de Polnareff para outras gerações e geografias, a editora XIII Bis Records criou um álbum de tributo que, com Betrand Burgalat como coordenador, juntou nomes como os de Nick Cave, Marc Almond, Bill Pritchard, Pascal Comelade, Blaine Reininger, Steven Brown, Peter Hammil, bandas como os Pulp, os Pizzicato Five, Saint Etienne, Gente People ou o coletivo Nouvelle Generation de la République Democratique du Congo que, em conjunto, criaram pontos de vista oriundos de vários pontos da Europa, América do Norte, África ou Ásia, celebraram a dimensão universal das canções de Michel Polnareff.

Apesar de algo esquecido – e de ter conhecido uma segunda edição que repetia parte do alinhamento e juntava outras contribuições – este é um dos mais sólidos e recomendáveis entre os muitos discos de tributo que nasciam como cogumelos nos anos 90. “A Tribute To Polnareff” é um disco a juntar, portanto, ao leque de excelência e para militar ao lado de “I’m You Fan” (dedicado a Leonard Cohen pela revista Les Inrockuptibles), “Red Hot & Blue” (com canções de Cole Porter) ou “Stay Awake” (canções de filmes clássicos da Disney numa operação coordenada por Hal Wilner, nome marcante na história dos discos e espetáculos de homenagem).

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