Foi há 30 anos que, num tempo em que os espaços do pop/rock alternativo alcançavam novos patamares de visibilidade, e que disputava então atenções com uma outra linha de propostas que procuravam caminhos novos possíveis para as batidas (via trip hop), um jovem californiano de cabelos loiros, então nos seus 24 anos, cativava entusiasmos ao som de “Loser”, canção que colocava o álbum “Mellow Gold” naquele raro patamar de elogios transversais que fazem habitualmente os mais sérios candidatos a “disco do ano”. Aclamado pouco depois numa noite de entrega dos Grammys com o posterior “Oldelay” (álbum de 1996 que sugeria pontes entre os caminhos do pop/rock, a cultura hip hop e novas estéticas de corte e colagem), Beck foi rapidamente reconhecido como um dos mais versáteis e inspirados cantautores da sua geração. Depois de ter reafirmado uma rara versatilidade (quase à la Prince) em discos como “Mutations” (1999) e “Midnite Vultures” (1999), Beck apresentou em 2002, no belíssimo “Sea Change” o álbum que ainda hoje podemos reconhecer como a sua obra-prima. Era um disco de alma melancólica, herdeiro das ideias de um Nick Drake e de um Scott Walker. Mas não foi ato único já que, 12 anos depois, tendo entretanto registado novas expressões da sua invulgar capacidade em ensaiar ideias diferentes – desta vez em “Guero” (2005), “The Information” (2006) e “Modern Guilt” (2008) – apresentou um sucessor direto desse mesmo álbum. Chamou-lhe “Morning Phase”. E nele fixou mais um episódio maior da sua discografia.
Entre “Sea Change” e “Morning Phase”, além dos três álbuns de inéditos, Beck produziu discos (de Charlotte Gainsbourg a Philip Glass, passando por Thurston Moore) e encetou uma série de sessões especiais com músicos convidados com os quais, no seu estúdio em Malibu, promoveu a gravação de versões de álbuns integrais de figuras como Leonard Cohen, Velvet Underground ou os INXS, tendo como regra fundamental o facto de cada sessão decorrer no espaço de apenas um dia. Em 2012 foi ainda mais ousado ao apresentar “Song Reader”, um “álbum” de novas canções que, em vez de gravadas, lançou apenas como partituras (como se fazia antes da era dos discos).

“Morning Phase” nasce num terreno feito de reencontros. Por um lado devolveu Beck a um terreno mais “tradicional” de apresentação de novas criações. Por outro retomou diretamente tanto o clima como as sonoridades de “Sea Change”. Na verdade, Beck tinha já tentado gravar este disco em 2005, em Nashville, mas deixara então o projeto incompleto. Mais adiante, tendo reunindo em Los Angeles, no mesmo espaço onde Frank Sinatra em tempos trabalhara, alguns dos músicos com os quais gravou esse mesmo álbum de 2002 (assumindo desta vez ele mesmo a produção), entregando novamente os arranjos de cordas ao seu pai (David R. Campbell), Beck apresentou-nos aqui o seu melhor álbum desde “Sea Change”. As referências são uma vez mais clássicas, apontando a figuras maiores como Nick Drake ou os Crosby, Stills, Nash & Young, com momento mais inspirado no esmagadoramente belo “Wave” onde a voz de Beck acaba rodeada pelo som de uma orquestra, sugerindo climas não muito distantes da obra de Scott Walker.





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