Ao invés de contemporâneos como os Fun-da-Mental, Loop Guru ou, pouco depois, a dupla Joi, o coletivo que entrou em cena nos anos 90 com o nome Transglobal Ungerground não tinha no seu núcleo filhos nascidos de diásporas oriundas de outras geografias, vivendo então em solo britânico. Tim Whelan (que então se apresentava como Alex Kasiek) e Hamilton Lee (que escolhera como pseudónimo Hamid Mantu), os dois fundadores do projeto, eram naturais da região de Londres e tinham já outras bandas e experiências nos respetivos percursos, uma delas partilhada por ambos nos Furniture, banda muitas vezes evocada como um exemplo de one hit wonders dos oitentas à conta do impacte (pontual, e sobretudo no Reino Unido) do single de 1986 “Brilliant Mind”. Se é verdade que depois abriram o line-up de várias etapas da vida dos Transglobal Underground a músicos com berços de diferentes geografias e culturas, a verdade é que foram experiências vividas na estrada por estes dois ingleses que os colocaram em contacto com outras músicas, em concreto quando, ainda com os Furniture, no final dos anos 80, deram por si a correr pelas estradas de países como a Jordânia, Egito, Chipre, Grécia, Turquia, Roménia e os territórios então sob as bandeiras da Jugoslávia e Checoslováquia. Num tempo em que o fenómeno da world music começava a cativar atenções para além dos nichos outrora mais atentos ao que acontecia para além dos eixos centrais da música pop(ular) com capacidade de comunicação global, a ideia de procurar caminhos de horizontes alargados para a sua música ganhou forma depois do ponto final dos Furniture. Durante uma curta etapa em que integram o Flavel Bambi Septet, projeto londrino já nascido em terreno da world music conhecem uma série de músicos, entre eles a futura vocalista dos Transglobal Underground Natacha Atlas, cantora e dançarina belga com ascendência egípcia, que tinha recentemente colaborado no (magnífico) álbum “Rising Above Bedlam” de Jah Wobble e em “Coming Down”, álbum a solo de Daniel Ash (ex-Bauhaus e então elemento dos Love & Rockets). 

Antes mesmo da entrada em cena de Natacha Atlas, o momento do nascimento dos Transglobal Underground é assinalado quando a dupla original se transforma num trio com a entrada de Nick Page, que também assume, tal como os parceiros, um pseudónimo: Count Dubulah. É este trio que se apresenta, em 1991, com o single de estreia “Templehead”, que desde logo revela uma vontade em cruzar ecos de músicas de outras geografias (sobretudo do médio oriente) com heranças naturais do hip hop, a presença do sampling como peça fulcral da composição, isto sem esquecer novas formas que as electrónicas então levavam às pistas de dança. Um ano depois, já com Natacha Atlas a bordo, “I Voyager” mostra um interesse em captar ecos da música do grande espaço cultural indiano e paquistanês que ganhará considerável protagonismo em vários episódios posteriores dos Transglobal Underground, contribuindo para o alavancar de toda uma nova geração de projetos com esta mesma genética, da qual surgem então nomes como os já referidos Fun-da-Mental ou Loop Guru, mas também os Cornerhop ou Bally Sagoo, entre muitos mais.

“Temple Head” e “I, Voyager” abrem o caminho a “Dream of 100 Nations”, álbum de estreia que vinca os caminhos aqui sugeridos e define então um marco na história de um espaço ao qual se veio a atribuir a designação worldbeat, fenómeno ainda ligado às capitais mais “clássicas” da indústria discográfica e, por isso, distinto das dinâmicas mais descentralizados da global club music da qual hoje se fala. Mesmo assim “Dream of 100 Nations” corresponde a uma etapa dessa mesma abertura das linguagens pop a outros horizontes, outras referências, integrando numa matriz ocidental ecos de culturas asiáticas, africanas e do médio oriente.

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

Trending