Depois de primeiros passos discográficos dados no Brasil (onde assinalou a sua estreia discográfica em 1961, tocando em sexteto), abrindo novos horizontes de possibilidades em digressões que logo a seguir passaram pela Europa e Estados Unidos, Sérgio Mendes tomou em 1964 uma decisão que iria mudar o curso da sua vida: fez as malas e rumou a Los Angeles. Convém lembrar que, por esses dias, já a bossa nova não era estranha aos ouvidos americanos, tendo Tom Jobim feito a sua primeira apresentação no Carnegie Hall em 1962, episódio de uma história de relacionamentos de novas músicas emergentes no Brasil com públicos internacionais que conheceu outro importante monumento quando, em 1963, João Gilberto gravou um primeiro disco com Stan Getz, o tal que incluía a mítica “Girl From Ipanema” na voz de Astrud Gilberto que seria marcante contribuição para todo este processo de conquista de visibilidade global do que estava a acontecer, musicalmente falando, em terras brasileiras. Tal como Astrud Gilbeto, Sérgio Mendes, natural de Niterói (onde nasceu em 1941), optou por permanecer nos EUA e aí fazer carreira. 

Assinou um novo acordo com a A&M Records, formou um novo grupo ao qual chamou Sérgio Mendes & Brazil 66 – Sérgio Mendes (piano), Lani Hall (voz principal), Karen Philip (voz de apoio), Bob Mathews (contrabaixo), José Soares (percussão) e João Palma (bateria) – e encontrou um lugar carregado de personalidade num ponto de encontro entre a bossa nova, o samba e espaços (e referências) da canção popular anglo-americana (do pop/rock à emergente soul). Apostou numa linguagem para os arranjos que traduzisse, de forma acessível, este mesmo modelo de cruzamentos possíveis. E desafiou as duas cantoras do grupo – ambas norte-americanas – a cantar ora em inglês ora em português (com sotaque), juntando-as a uma secção rítmica rodada na bossa nova… Et volià… Nasceu uma linguagem.

Produzido pelo executivo da editora que o chamara ao catálogo e cujo nome surgiria no título do próprio álbum, o primeiro disco gravado por Sérgio Mendes com o seu grupo Brazil 66 resultou num sucesso tremendo. E apesar de apresentar uma versão de “Day Tripper” dos Beatles ou uma outra para “Slow Hot Wind” de Henry Mancini, a verdade é que o tema que mais visibilidade deu ao álbum foi “Mais Que Nada”, um original de Jorge Ben que surgira dois anos antes no seu álbum de estreia “Samba Esquema Novo”. Esta não era, de resto, a única presença no alinhamento de abordagens a peças recentes de uma nova família de acontecimentos na música brasileira, surgindo ali novas leituras para o “Samba de Uma Nota Só” de Tom Jobim e Newton Mendonça ou “Berimbau” de Baden Powell e Vinicius de Moraes. Com vendas que lhe permitiram chegar ao Top 10 nos EUA, arrebatando um disco de ouro, “Herb Alpert Presents Sérgio Mendes & Brazil 66” abriu um modelo de trabalho que o protagonista desta aventura tomaria como paradigma para uma série de edições não apenas nos anos 60 como nos 70 (aí já sob a designação Sérgio Mendes & Brazil 77, mais adiante com a variação Sérgio Mendes & His New Brazil 77). E pelo caminho voltaria recriar versões de grandes canções, ora regressando aos Beatles em “Fool On The Hill” ou “With A Little Help From My Friends” ou assimilando a música de Stevie Wonder em “I Believe (When I Fall In Love It Will Last Forever)” Aretha Franklin em “I Say A Little Prayer” (na verdade uma composição de Burt Bacharach) ou a de Cole Porter em “Night and Day”, entre muitas outras. Mas foi em 1966, com neste álbum produzido por Herb Alpert, que lançou as bases para uma obra que, com o passar dos tempos, o faria trabalhar com nomes como Jill Scott, John Legend, Seu Jorge, Pelé, Carlinhos Brown, Gilberto Gil, Edu Lobo, Ledisi, Q-Tip, Jovanotti ou o próprio Stevie Wonder.

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