Os melhores discos de 2020 (3. nacional)

Continuo apresentar as listas dos melhores de 2020. Hoje falo das edições nacionais que foram surgindo ao longo dos 12 meses. Os discos novos na área da música popular, mas também as edições de arquivo, reedições e espaços para outras músicas. Escolhas e textos: Nuno Galopim

NOVOS ÁLBUNS: Pop Dell Arte “Trangressio Global”

Não aceitar as regras que são impostas, transgredir os limites… todos os limites… A ideia é antiga, mas foi materializada numa canção que começou por ganhar voz em 2015 e agora, numa nova versão, integra a carne daquele que é o melhor álbum de sempre na obra dos Pop Dell’Arte. Mas para que dizer “o melhor” não gere equívocos nem leituras toca-e-foge, nada como contextualizar a coisa… E para isso é preciso viajar no tempo… No fundo, partilhando algo em comum com as ideias que escutamos neste novo Transgressio Global. Este é um disco que só podia ser feito pelos Pop Dell’Arte. Mas que só hoje os Pop Dell’Arte poderiam fazer. Nos antípodas do conformismo, aprenderam cedo a falar a linguagem da transgressão. Nunca a deixaram de usar. Mas hoje dominam os léxicos. E em Transgressio Global dão-nos o seu melhor álbum. Pode não exercer culturalmente o mesmo poder sísmico que Free Pop lançou sobre os edifícios da criação pop portuguesa em finais dos anos 80. Mas não deixa de ser o seu melhor disco. Resistir, já dizia o grande José Mário Branco, é vencer!

E além do disco dos Pop Dell’Arte, da (boa) colheita de 2020 destaco outros discos como os que se seguem (por ordem alfabética):

Benjamim “Vias de Extinção”

Birds Are Indie “Migrations – Travel Diaries #1”

Cabrita “Cabrita”

Capicua “Madrepérola”

Clã “Véspera”

Cristina Branco “Eva”

Dino d’Santiago “Kriola”

Filipe Sambado “Revezo”

JP Coimbra “Vibra”

Lina + Raül Refere “Lina_Raül Refere”

Mancines “II”

Noiserv “Uma Palavra Começada Por N”

Norton “Heavy Light”

RIVA The Wizzard “Loucura Censura”

Samuel Úria “Canções do Pós-Guerra”

Selma Uamusse “Liwoningo”

Slow J “sLo-Fi”

Três Tristes Tigres “Mínima Luz”

Vaiapraia “100% Carisma”

CANÇÕES: Ana Moura / Branko / Conan Osiris “20/20”

Foi uma surpresa em plena atuação de Conan Osiris no Coliseu dos Recreios em final de 2019. Ana Moura entrava em palco. Branko surgia no camarote presidencial. E 20/20 juntava os três músicos numa proposta que junta tudo o que de melhor a música podia imaginar para expressar uma ideia de identidade no início da terceira década do século XXI. A canção sugeria um ponto em que as três histórias (musicais) de cada um se cruzavam. E tem tudo para abrir novas possibilidades a todos eles e à própria demanda de expressões de contemporaneidade para a música portuguesa.

Além desta canção, destaco ainda (e por ordem alfabética dos intérpretes):

Capicua com Karol Conká “Madrepérola”

Carlão “Assobia Para o Lado”

Elisa “Medo de Sentir”

Filipe Sambado “Gerbera Amarela do Sul”

Lina + Raül Refere “A Mulher Que Já Foi Tua”

Mancines “Is This a Go”

Moullinex “Luz”

Pop Dell’Arte “The King of Europe”

Throes & The Shine “Movimento”

ARQUIVO: Amália Rodrigues “Amália em Paris”

Foram várias as ocasiões em que Amália Rodrigues fez questão de sublinhar o modo como fora Paris quem lhe tinha dado o definitivo passaporte para uma carreira internacional de grande visibilidade. Assim foi, e o momento em que se fez o “clique” teve lugar em 1956, no palco do Olympia. Um ano antes tinha chegado às salas de cinema o filme Les Amants du Tage, no qual Amália tinha uma participação, cantando a dada altura Barco Negro, canção que gerara um caso evidente entusiasmo além-fronteiras… O Barco Negro lá estava, entre outras mais canções, no alinhamento de um espetáculo que colocava Amália num espaço já com algum destaque. Convém sublinhar que os grandes fluxos de emigração portuguesa para França ocorreriam depois, pelo que aquela mítica sala parisiense estava, naquela noite, com gente… da casa. Franceses. O timbre, a presença, a força da voz e o som da guitarra portuguesa habitaram as palavras de entusiasmo com que, depois, os jornais davam conta de uma descoberta… A da rainha do fado, como lhe chamaram. Na verdade Amália cantava em Paris desde a sua estreia em 1949. E logo nessa ocasião tanto passou pela Casa de Portugal como pelo seleto Chez Carrère (esta vontade em somar públicos foi, de resto, um facto reafirmado em muitas das viagens de regresso à cidade, com passagens pelos palcos que manteve até 1990, quando participou numa gala de mobilização de artistas pela luta contra a sida). Estas e outras memórias parisienses são agora o tutano de uma verdadeira caixa de memórias. Tem por título Amália em Paris e junta, em 5 CD e um booklet, aquele que representa o primeiro lote de incursões pelos arquivos de Amália no ano em que se assinala o seu centenário.      

Além desta caixa de Amália Rodrigues, há que destacar ainda estas outras edições de arquivo e reedições (por ordem alfabética dos intérpretes):

Amália Rodrigues “Ensaios” (álbum em CD)

Blackout “Blackout” (reedição em vinil)

David Fonseca “Lost and Found – B-Sides and Rarities” (compilação digital)

Da Weasel “Re-Definições” (reedição em vinil)

Pedro Ayres Magalhães “O Ocidente Infernal” (reedição em vinil)

Rocky Marsiano “Meu Kemba” (reedição em vinil)

Sérgio Godinho “Pano Crú” (reedição em vinil)

Sérgio Godinho “Campolide” (reedição em vinil)

Victor Rua “Electronic Music 1995-2010” (compilação em CD)

JAZZ / CLÁSSICA / EXPERIMENTAL: Joana Gama / Drumming GP / Luis Fernandes “Textures & Lines”

O universo da música exploratória criada entre nós acaba de receber um disco maior. Trata-se de “Textures & Lines”, que une o Drumming – Grupo de Percussão, à pianista Joana Gama e às eletrónicas de Luís Fernandes. Subtil e desafiante, convida-nos a caminhar, como o título sugerem entre texturas… e linhas.  A criação de Textures & Lines partiu na verdade de um desafio lançado pelo Drumming – Grupo de Percussão (do Porto) a Joana Gama e a Luís Fernandes. A música agora fixada em disco é contudo parte de um todo que se completa, em atuações ao vivo, com a junção de imagens criadas em vídeo, em tempo real, por Pedro Maia. Havia concertos marcados, entretanto cancelados… A seu tempo as linhas de tempo do disco e dos palcos acabarão por se reencontrar, como esta música sugere. Para já, escutemo-la. E preparem-se para boas descobertas.

Outros títulos a ter em conta entre o panorama além da música popular são “Archipelago” de Luis Tinoco com o Drumming GP (na verdade foi lançado em 2019 mas só o ouvi este ano e arrebatou um Prémio Play) e ainda o mais recente “Atlântico” do grande Mário Laginha.

O CONCERTO: Salvador Sobral + André Santos

É verdade que houve concertos presenciais em 2020. Muito menos do que o habitual, mas houve música ao vivo. Porém, na hora de fazer um retrato do ano, não podia deixar de escolher o que mais o caracterizou: a música à distância… e online. E houve grandes e belos momentos de comunhão, sobretudo no confinamento inicial da primavera. E o primeiro momento chegou logo em meados de março quando Salvador Sobral e André Santos juntaram milhares de pessoas em volta de uma transmissão ‘online’ de música ao vivo. O alinhamento foi arrebatador. E o “concerto” gerou um momento partilhado particularmente emotivo dado o momento que se vivia.  Convém lembrar que, quanto ao que nos mostraram naquela noite, havia uma ideia já em marcha: a série Quinta das Canções (e nada como ver ou rever os muitos vídeos já disponíveis online). Perante um cenário que começava a ver o cancelamento de uma série de concertos (nacionais e internacionais), Salvador Sobral juntou-se uma vez mais a André Santos para um concerto que, na verdade, não fugiu à ideia das live sessions que, com vários amigos, o cantor português tinha apresentando recentemente. Mas aquela foi uma noite especial. O noticiário determinava-o. E a noite não podia, depois, ter corrido melhor.

Um pensamento

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