Os 40 anos álbum de 1981 dos OMD “Architecture & Morality” são assinalados com uma edição especial que recupera os singles dele extraídos e junta maquetes, sessões de estúdio e gravações ao vivo daquela etapa na obra do grupo britânico. Texto: Nuno Galopim

Naturais de Liverpool, os Orchestral Manouevers In The Dark representaram uma das primeiras forças da linha da frente da primeira geração pop electrónica na Inglaterra de finais de 70. O seu single de estreia, Electricity (em 1979) foi o sexto editado pela Factory Records. Contudo, a carreira dos OMD (assim acabaram conhecidos) fez-se depois, essencialmente, na Dindisc, uma pequena editora sob distribuição da Virgin Records. Os seus dois primeiros álbuns, Orchestral Manouevers In The Dark e Organization, ambos editados em 1980, lançaram pistas e primeiros sinais de uma vida dupla, tranquilamente dividida entre gosto em criar hinos pop e a curiosidade pelas potencialidades das novas ferramentas ao serviço da música electrónica. E não houve álbuns tão capazes de expressar essa dupla vida como Architecture & Morality, de 1981 e o seu inesperado e desafiante sucessor, Dazzle Ships, de 1983.
Regressemos hoje a Architecture & Morality. O título do álbum encerra, por si só, um programa de intenções, como que querendo mostrar como se concilia o que aparentava ser inconciliável. O rigor matemático da electrónica e a sede de descoberta, aleatória, da criação artística. Menos sombrios que contemporâneos como os Cabaret Voltaire ou John Foxx, menos efusivos que os Human League (reinventados em versão 2.0 para Dare!), A Flock Of Seagulls ou Depeche Mode), menos “teatrais” do que os Soft Cell ou Fad Gadget, os OMD pareciam viver numa terra de ninguém, não equidistante das linhas mestras da pop electrónica em erupção, mas orientados segundo um gosto peculiar que, no texto que acompanha a “collectors edition”, o jornalista Paul Morley descreve como o que poderia ser o futuro da Joy Division, “caso Love Will Tear Us Apart tivesse sido o começo e não o fim”. O álbum destaca-se dos muitos que essa geração pop então apresentou, propondo uma sugestão temática em torno de um ciclo de canções com uma figura (e sua simbologia) como protagonista: Joana d’Arc. Um fascínio pela mulher, a sua história, a relação com a fé e religião, traduz-se numa visão que não é de reflexão histórica, mas de recontextualização da sua imagem e heranças num futuro sem data. E mesmo aí, mais que um retrato concreto, optam por uma visão impressionista que, da história, herda sobretudo sugestões de uma vida armadilhada por um sentido de dever ditado mais pela emoção que pela razão.
Este não é o álbum de pop electrónica “típico” do seu tempo, sobretudo numa banda que gozava já de uma certa visibilidade mainstream, tendo já colhido primeiros êxitos, em 1980, com Messages e Enola Gay e que conseguiu depois levar os três singles extraídos de Architecture & Morality (sucessivamente Souvenir, Joan of Arc e Maid Of Orleans, ao top five britânico). Canções e instrumentais texturalmente ricos em figuras nascidas de uma exaustiva exploração das potencialidades do mellotron e técnicas de estúdio empregando o uso de fitas (muito em voga na música concreta e junto de bandas de rock progressivo nos anos 70) fazem um álbum que traduz o seu tempo. Mas que, como poucos da sua geração, sobrevivem, 40 anos depois, da primeira à última faixa.
Em tempo de assinalar as quatro décadas de vida deste disco eis que surge uma edição que reune os três singles extraídos deste álbum (ou seja, Souvenir, Joan of Arc e Maid of Orleans) a eles acrescentando alguns inéditos como maquetes, sessões de estúdio e gravações ao vivo, amplificando olhares sobre o trabalho dos OMD por aqueles dias. Um mergulho entre memórias de um dos melhores discos da primeira geração da pop britânica made in UK.
“Architecture & Morality: The Singles”, dos OMD, está disponível em vinil (3 X 12″), CD e nas plataformas digitais, numa edição da UMC.