Editado em fevereiro de 1993 o disco que acabou conhecido como “Wedding Album” mostrou que o grupo não seria um caso a fechar nas memórias dos anos 80 e abriu portas a uma etapa de vida da qual nasceram alguns clássicos ainda hoje levados a palco. Texto: Nuno Galopim

Os resultados discretos e artisticamente magros de Liberty assinalaram a chegada dos Duran Duran aos anos 90 num patamar consideravelmente distante daquele que haviam conhecido na primeira metade da década anterior. A ideia de não regressar à estrada estava já tomada quando o álbum foi lançado, pelo que o grupo estava pouco depois a trabalhar já em novas canções. Tendo pontualmente voltado a ser um quinteto, ficaram então reduzidos a quatro elementos com a saída do baterista Sterling Campbell, que pouco depois estaria em estúdio e, logo a seguir, na estrada, com David Bowie.
Instalaram-se num estúdio caseiro montado na sala de estar da casa do guitarrista Warren Cuccurullo – ao qual chamaram Privacy Studio – e aí começaram a registar maquetes, aos poucos ganhando forma um disco distante das sonoridades que o grupo havia seguido nos anos 80, mas distinto dos caminhos explorados em Liberty. Uma das primeiras canções a atingir a forma final foi Ordinary World, uma balada de travo clássico que começou a ser rodada numa estação de rádio em Los Angeles em finais de 1992, numa altura em que o disco estava praticamente concluído.
O entusiasmo com que a canção começava a ser acolhida – e que devolveria o grupo ao top ten nos EUA e Reino Unido em inícios de 1993 – lançou sinais de alerta junto da editora que, meses antes, não parecia particularmente entusiasmada no facto de ter em mãos um novo álbum dos Duran Duran. Não só o orçamento para gravação tinha sido substancialmente mais contido do que em discos anteriores como, numa altura em que o disco estava pronto para editar, o plano de lançamento pareceu ao novo management da banda ficar aquém das necessidades do álbum. O disco chegou mesmo a sair da agenda de lançamentos por algum tempo, entrando em cena perante a receção de Ordinary World. No compasso de espera John Taylor retirou-se para Los Angeles e chegou a ponderar a saída do grupo. Nesse mesmo período, e de uma improvisação em volta do riff de First Impressions do álbum de 1990, nasceria Come Undone, canção mid-tempo que seria acrescentada ao alinhamento do álbum já depois de todos os outros temas concluídos e que, meses depois, lhes daria novo êxito, vincando a postura mais adulta que o grupo entretanto conquistara com Ordinary World.
O grupo tinha chamado ao estúdio o produtor John Jones, com o qual havia já feito o single Burning The Ground (1989) e que havia trabalhado com Chris Kimsey na gravação de Liberty. De horizontes mais abertos, a produção deu espaço ao reemergir de duas características fulcrais da música dos Duran Duran algo toldadas no disco de 1990: a presença do trabalho elaborado de sintetizadores de Nick Rhodes e as frequentes incursões da música do grupo pelos espaços da música de dança. A primeira manifesta-se não apenas nas cenografias plácidas de Come Undone, mas também em Shelter. A segunda emerge em Drowning Man, uma assimilação pop de uma matriz de escola house que chegou a gerar um single lançado apenas em formato de máxi (em apenas alguns territórios). A já clássica relação com heranças R&B, que vem de Union of The Snake, Notorious e, em Liberty, emergira no tema-título do álbum, regressa em Love Voodoo. O experimentar de outras potencialidades do trabalho de samples revela no curto Shotgun um interesse por novas formas. O clima indie pop do momento, que assistira a uma série de interessantes diálogos entre a música de dança e os espaços pop/rock cativava a atenção dos Duran Duran (abrindo de resto a mais presente das suas marcas de identidade ao longo dos anos 90), revelando-se em canções como UMF, None of The Above e, mais ainda, em Too Much Information, canção que abre o lançamento do álbum e foi escolhida depois como terceiro single. Muito diferente dos dois singles anteriores, não foi contudo tão bem sucedido, deixando com menor visibilidade uma canção que vincava o emergir de uma voz política, que comentava aqui modos de funcionamento de quem edita e divulga música.
Essa alma mais política e uma nova vontade em olhar temas do mundo à sua volta é contudo mais vincada em Sin of The City, canção que encerrava o alinhamento do álbum, nascida do impacte de um incêndio que intencionalmente ceifou vidas num clube em Nova Iorque em 1990. O alinhamento revelava pela primeira vez a presença num álbum de uma versão, revelando uma leitura para Femme Fatale, dos Velvet Underground e abriu portas a uma experiência ao jeito do Pin Ups de Bowie que surgiria em disco dois anos depois. Uma das maiores surpresas do alinhamento do álbum foi contudo – e sobretudo para quem fala português – um dueto bilingue com Milton Nascimento em Breath After Breath.
O impacte de Ordinary World ainda antes de editado o álbum e um primeiro convite para um set acústico logo por essa altura abriram caminho a uma digressão diferente das habituais que, sob a designação An Acoustic Evening With Duran Duran, correu palcos europeus e, a dada altura, alternou mesmo datas com uma nova tour elétrica – a Dilate Your Mind Tour – que entretanto também ganhara forma. Algumas gravações desta digressão acústica emergiram em lados B dos singles extraídos do álbum.
Falta falar do título do álbum… Com vontade de assinalar aqui um novo recomeço, resolveram chamar-lhe simplesmente Duran Duran. O facto de a capa ter nascido da reunião de fotos dos casamentos dos pais dos quatro elementos da banda fez com que, informalmente, acabasse conhecido como The Wedding Album. O disco representou um renascimento criativo e em popularidade quando muitos votavam o grupo ao arquivo das memórias da década passada. Deu-lhes em Ordinary World um dos seus maiores êxitos. E globalmente os melhores resultados desde os dias de Seven and The Ragged Tiger, dez anos antes.
O alinhamento revelava pela primeira vez a presença num álbum de uma versão, revelando uma leitura para Femme Fatale, dos Velvet Underground e abriu portas a uma experiência ao jeito do Pin Ups de Bowie que surgiria em disco dois anos depois.
Que, como já disse aqui anteriormente, foi o momento em que deram cabo do balanço entretanto recuperado com o disco que esta posta tão bem analisa. Hélas!
GostarGostar