Depois de um álbum de estreia que traduziu ainda ecos naturais dos Joy Division e de um outro, de busca de um novo caminho, foi em 1985, com “Low Life”, que os New Order encontraram o primeiro disco do resto das suas vidas. Texto: Nuno Galopim

Se o álbum “Movement”, de 1981, era ainda a clara expressão de um grupo de músicos a lidar com a “presença” de um ausente (Ian Curtis) e, ainda, os ecos naturais dos Joy Division, e se em “Power Corruption and Lies” sentíamos sinais de busca por novos caminhos entretanto a serem igualmente desbravado nos singles daqueles tempos, é na verdade só em “Low Life”, de 1985, que os New Order encontram uma mais nítida expressão da identidade que procuravam (confirmando os azimutes apontados em 1983 pelo single “Blue Monday”). A descoberta da América (e de novas formas e sons que ali desenhavam a club culture que tinha emergido após a primeira vida do disco) representa uma entre as várias somas de vivências que então moldam uma pop que tanto é herdeira de uma genética elétrica como capaz de assimilar os sinais dos tempos de uma nova música de dança que tomava as eletrónicas como ferramentas do quotidiano.
Era contudo uma música de dança diferente das faces mais luminosas do electro ou hi-nrg que soavam por aqueles dias entre Nova Iorque e São Francisco, já que a música dos New Order nascia também de um certo desencantamento urbano que era partilhado por muita da música indie britânica de então, comum por isso a bandas suas contemporâneas, dos The Cure aos Echo & The Bunnymen e outros mais (e basta olhar para a história social britânica dos finais dos setentas e inícios oitentas para o entender). O escapismo, até mesmo nos New Order, chegaria apenas mais adiante, com “Fine Time” e o álbum “Technique”, quase a caminho dos noventas. Mas, e sobretudo depois de “Blue Monday”, a alma sombria de muitas vidas urbanas já tinha aprendido a dançar… E esta era a banda sonora perfeita para aquele momento.
Apresentado por “The Perfect Kiss” (e era primeira vez que singles dos New Order chamavam atenções para o alinhamento de um álbum), “Low Life mostrava uma banda em momento de pico criativo, capaz de enfrentar o espaço vazio dos estúdios para de lá sair com ideias na forma de grandes canções capazes de criar uma coleção coesa e consequente. Basta escutar “Love Vigilantes” ou “Face Up”, que respetivamente abrem e fecham o alinhamento e notar como são pontos de partida e chegada de um todo coerente que integra, além de “The Perfect Kiss”, o igualmente pungente “Sub-Culture”, extraído como single alguns meses depois, ou ainda “Elegy”, instrumental cuja versão completa (com cerca de 17 minutos) surgiria em reedições apenas anos depois.
Na sequência de caixas que antes visitaram já os álbuns der 1981 e 1983, eis que nos chega uma terceira edição especial, esta focada nos dias de “Low Life”. O álbum, na sua expressão original, surge aqui tanto nos suportes de LP como CD, havendo depois um CD extra com elementos captados nas sessões de estúdio durante as quais as canções ganharam forma, que inclui ora os instrumentais de alguns temas tirados das suas “writting sessions”, esboços, maquetes e a tal versão longa de “Elegy”. A caixa inclui ainda dois DVD com atuações desta etapa, notando-se o progressivo afastamento de material dos Joy Division nos alinhamentos. O livro que acompanha a edição apresenta uma história oral desta etapa e ainda fotos ora de instrumentos e fitas ligados à criação do álbum e imagens da banda por estes dias. Nota ainda para o modo como CD e LP respeitam a capa original, reproduzindo pela primeira vez os rostos dos músicos, com a possibilidade de cada um escolher qual quer usar na frente e verso. Pena, ainda no departamento das imagens, a caixa não incluir os telediscos desta etapa. Se nos lembrarmos que o de “Perfect Kiss” foi realizado por Jonathan Demme reforça-se o peso dessa ausência.

“Low Life – Definitive Edition”, dos New Order, é uma caixa com 1LP, 2CD e 2Blu-ray, numa edição da Warner Music.