Entre os nomes maiores da história da música portuguesa há uma banda impossível de rotular. Pelos seus discos passaram referências diversas, das escolas folk que cativavam atenções em finais dos anos 60 e inícios da década de 70 às próprias músicas de raiz tradicional e rural, a ecos de universos de culturas urbanas, desde terrenos mais próximos de linguagens da música elétrica ao jazz. Cada disco foi diferente do anterior e do seguinte. E, logo na sua estreia, do single de apresentação em finais de 1974 ao primeiro álbum, editado em 1975, ousaram algo que parecia fora do quotidiano do Portugal de então: revelavam-se subversivos, mas politicamente não alinhados. 

A ideia de pluralidade habita a música da Banda do Casaco desde o início, desde logo dadas as raízes e pré-histórias dos seus elementos. Nuno Rodrigues tinha integrado o quarteto Musica Novarum. Daphne também passara pelo mesmo grupo grupo, com etapa seguinte a bordo dos A Family Fair, por onde se cruzavam ainda  Carlos Zíngaro e Celso de Carvalho. António Pinho, por sua vez, fizera parte da Filarmónica Fraude, cujo álbum único, editado em 1969, representa um dos  episódios mais ousados de uma etapa de emergência de uma linguagem pop/rock portuguesa já despida dos mimetismo mais evidentes nos dias do ié ié.

Desde cedo ficou claro que a uma demanda musical desafiante o grupo juntava uma visão muito própria na gestão da palavra. Do lirismo poético ao nonsense, passando por uma capacidade em refletir sobre o presente de um país a descobrir a vida em liberdade mas sem recorrer a panfletarismos, asa canções da Banda do Casaco propunham rotas tão diferentes como estranhamente familiares, ou não houvesse aqui, logo nos alicerces, uma assimilação de ecos da própria cultura popular portuguesa e, também, evidentes sinais dos tempos num país em rota de evolução política, social e cultural. Eram uma banda, como em tempos escrevi, soube ser plural” vivendo sem “compromissos com nada, nem com dinheiro, nem com ideologias, com modas, com editoras ou os palcos”. E vale a pena juntar ainda mais um detalhe: o som. Daí a importância de um sólido relacionamento que, ao longo dos anos, foram desenvolvendo com o técnico José Fortes, que foi gravando os seus discos. 

Em tempos, numa entrevista à revista “Música & Som”, o próprio Nuno Rodrigues descreveu a Banda do Casaco como uma “banda de catálogo”, ou seja, que viva para além das eventuais “preocupações de estar à la page, de vender espetacularmente e depois ser esquecidos”. E assim trilhou um caminho diferente entre o dos diferentes. De facto único, definindo uma das obras mais cativantes da história da música popular portuguesa. 

Em 2025 assinala-se a passagem de 50 anos sobre a edição do álbum de estreia da Banda do Casaco. E por isso mesmo, por aqui, vamos, ao longo dos próximos meses, “escutar” os seus discos, um a um.

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ÁLBUNS

1975. “Dos Benefícios Dum Vendido No Reino Dos Bonifácios”

Antecedido ainda em finais de 1974 por um single que revelava duas canções do seu alinhamento (“Lavados Lavados Sim” no lado A e “A Ladainha das Comadres” na outra face), o álbum “Dos Benefícios Dum Vendido No Reino dos Bonifácios” chegou já em 1975 e logo destoou de todo o universo discográfico ao seu redor. Primeiro pelo invulgar cruzamento de referências (da folk ao jazz, das periferias da nova música urbana a olhares sobre o país profundo), pela profusão de elementos cénicos em jogo e, num ano politicamente “quente”, pelo facto de se apresentar como uma proposta não alinhada. Mais do que criar e moldar canções como um manifesto político ou expressões dos ecos de um quotidiano altamente politizado, a Banda do Casaco procurou antes fixar em disco uma expressão da sua forma de estar no mundo, no país, naquele tempo. Este foi o disco que inscreveu uma noção de produção com peso maior no mapa discográfico português. 

Texto completo aqui

1976. “Coisas Do Arco da Velha”

1977. “Hoje Há Conquilhas, Amanhã Não Sabemos”

1979. “Contos da Barbearia”

1980. “No Jardim da Celeste”

1982. “Também Eu”

Presente no coletivo desde o início da aventura, António Avelar Pinho fora o responsável pela criação das palavras que acentuavam o caráter desalinhado e um muito peculiar sentido de humor que cruzara as canções do grupo nos seus primeiros cinco álbuns. Depois de “No Jardim Na Celeste” afastou-se do projeto, deixando um dilema por resolver: e agora, que palavras para as novas canções? A resposta chegou num voo de avião de Londres para Lisboa, quando o técnico de som José Fortes sugeriu a Nuno Rodrigues que encarasse a voz como som. Nasceram então as “ilustrações fonéticas” que, com pontuais episódios de exceção, se tornaram assim uma das marcas distintivas deste disco de 1982 no qual se destaca, igualmente, a presença de Né Ladeiras, cuja voz marcou “Salve Maravilha”, que se afirmaria como um dos maiores êxitos do grupo.

Texto completo aqui.

1984. “Banda do Casaco com Ti Chitas”

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SINGLES

1974. “Lavad os Lavados Sim” / “Ladainha das Comadres”

1975. “Ao Cabo D’Um Ano”

1976. “É Triste Não Saber Ler”

1980. “Natação Obrigatória”

1984. “Dono da Noite”

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COMPILAÇÕES

1982. “A Arte e a Música da Banda do Casaco”

1988. “Banda do Casaco”

2013. “Banda do Casaco” (Caixa 1)

2013. “Banda do Casaco” (Caixa 2)

2013. “40 Anos de Som”

A discografia da Banda do Casaco inclui dois títulos em séries budget. Um deles é “Natação Obrigatória”, da série Caravela, em 1996. O outro, com alinhamento partilhado com a Filarmónica Fraude, surgiu em 2001 na série O Melhor de 2.

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