
“Hope In a Darkened Heart”
Wea (1986)
Um disco perdido não é só aquele que por vezes acaba esquecido entre a multidão de tantos outros lançamentos. É também aquele que deixa de ter visibilidade junto de novas gerações porque os planos de reedições deixaram de o contemplar. Um exemplo? Vejamos o sublime Hope in a Darkened Heart. Já está disponível em plataformas digitais (no Spotify é contudo o único título disponível de Virginia Astley). Mas quem quiser uma edição em CD que se prepare para desembolsar uns valentes trocos por uma cópia nova “import” em primeira mão. É que, salvo algumas reedições em CD feitas no Japão (a mais recente data de 2009), as cópias que por aí andam datam dos anos 80, tanto em LP como CD… Este, de resto, é um daqueles títulos que continuam ausentes da recente vaga de reedições em vinil…
Naturalmente poderá haver razões editoriais (do foro empresarial, eventualmente no patamar direitos de edição, estou a conjeturar) para que tão belo disco se tenha transformado sobretudo numa peça de “colecionador”. A situação pode assim valorizar a sua memória. Mas convenhamos que é disco que merecia mais que este relativo silêncio salvo para os que o descobriram (e eventualmente compraram) nos oitentas ou os que têm carteira suficientemente recheada para compras deste calibre…
Mas falemos agora do disco e de quem o assina. Nascida (em 1959) e criada numa família com tradições musicais, Virginia Astley estudou na Guildhall School of Music, estabelecendo uma formação clássica que lhe permitiria outro fôlego criativo mais tarde. Começou por pequenas colaborações em finais dos anos 70, teve breve passagem pela (visionaria) editora belga Les Disques du Crepuscule e, depois de uma breve etapa em palco com os Teardrop Explodes e de integrar os Ravishing Beauties em inícios dos oitentas, resolveu arregaçar mangas e editar a sua própria música.
Gravou um primeiro álbum que ficaria na gaveta até mais tarde, estreando-se em 1983 em From Gardens Where We Feel Secure, disco conceptual de alma paisagista (uma espécie de revisitação do conceito das ‘quatro estações’) que cativou atenções e a colocou entre as grandes revelações do seu tempo e que há alguns anos conheceu reedição em suporte de CD.
Hope in a Darkened Heart surgiu em 1986 e revelou uma vontade em explorar o universo da canção pop sem contudo abdicar as tonalidades pastorais e do registo onírico que a sua música começara a tomar. Produzido por Ryuichi Sakamoto e contando com a colaboração vocal de David Sylvian (o dueto Some Small Hope abre o alinhamento e é uma das mais belas canções daquele tempo), este é um disco de formas claras e clássicas, de canções que conciliam a presença de electrónicas (dominantes) com o piano, sinos e arranjos de cordas, a nitidez da produção de Sakamoto fazendo do alinhamento uma pérola de perfeição em regime pop. Silenciado pelo tempo por razões que alguma razão (que desconheço) poderá um dia explicar, Hope In A Drakened Heart é pérola de meados de 80 que urge reencontrar. E deliciosa porta de entrada para a (re)descoberta do universo de Virginia Astley.
Eu tenho este vinil, comprado no seu lançamento.
Na altura por causa do tema “Some Small hope” com David Sylvian. Fiquei fan do disco todo. Guardo-o religiosamente, assim como outros.
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