Os Cocteau Twins, em busca de uma música que soasse como um sonho belo

A campanha de reedições, no formato de LP em vinil, da discografia dos Cocteau Twins, acaba de recuperar dois títulos históricos. Um deles é “Garlands”, o seu disco de estreia, de 1982. O outro é o superlativo “Victorialand”, de 1986). Texto: Nuno Galopim

A discografia dos Cocteau Twins tem vindo a reaparecer nas listas de novos lançamentos (departamento reedições, claro), devolvendo os títulos ao mercado em novas prensagens em vinil… E o mais recente lote de reedições junta dois discos absolutamente marcantes. Um porque foi o primeiro disco do grupo. Outro porque representou, em 1986, um dos momentos mais belos (e elogiados) de toda a sua obra.

Comecemos então por Garlands. Corria o ano de 1982 e os Cocteau Twins, que tinham dado os seus primeiros passos na Escócia, em 1979, estreavam-se em disco com um álbum na 4AD. Não havia ainda a noção de um “som 4AD”. De resto, caberia ao processo de evolução da música dos próprios Cocteau Twins, juntamente com os australianos Dead Can Dance e o projeto This Mortal Coil, criado pelo próprio chefe da editora, a criação de uma personalidade que, juntamente com o trabalho gráfico apresentado nas capas dos discos, definiu uma marca de identidade ao catálogo da 4AD (isto apesar de haver ali outros artistas e grupos a seguir caminhos diferentes). Garlands, na verdade, estava mais perto dos paradigmas do rock gótico do que dessa música mais onírica e elegante que emergiria pouco depois. O baixista Will Heggie (naquele que foi o único álbum dos Cocteau Twins no qual tocou, tendo-se mantido abordo apenas nos dois EPs que se seguiram a este LP de estreia) mostrava evidentes afinidades com o som de baixo que então escutávamos nos discos dos The Cure ou até com heranças dos Joy Division e New Order (fase inicial). Já havia em Elisabeth Fraser uma personalidade no canto. E na composição e produção eram já evidentes as visões de espaço que depois seriam aprofundadas. Mas Garlands é ainda um retrato de uma busca, que não esconde que, não só os The Cure, mas também Siouxsie & The Banshees, eram então referências que sugeriam rotas possíveis… Mesmo assim, em Wax & Wane, com a ajuda de programações nos ritmos, nasce um primeiro “clássico”.

Já com Simon Raymonde na formação, a música dos Cocteau Twins conhece francos episódios de progressão rumo à demarcação de uma identidade própria, num caminho que se desenha mais nítido em Head Over Heels (1983) e já não deixa dúvidas no belíssimo Teasure (1984), episódios de uma história que, para saboreada na sua plenitude, requer uma passagem pelos títulos a 45 RPM (singles e EPs) que vão surgindo nesse período. Mas em 1986 o álbum Victorialand levou-os ainda mais longe. Com Simon Raymone de fora (estava nesse momento focado na criação do segundo álbum dos This Mortal Coil), Elisabeth Fraser e Robin Guthrie desenharam um disco mais ambiental, sem bateria, feito daquilo a que sabem os sonhos mais belos. O alinhamento é, mais do que nunca, rico em texturas, que moldam as paisagens pelas quais a voz esvoaça, surgindo ali um dos mais belos discos de toda a década de 80 (e um dos títulos fulcrais na criação daquela ideia de “som 4AD” a que aludia mais acima. Contando com a colaboração de Richard Thomas (dos Dif Juz) no safoxone e tablas, Victorialand olhou para paisagens e narrativas passadas na Antártida para desenhar um ciclo de canções suaves, doces, envolventes. Mais do que nunca os Cocteau Twins afastam-se aqui dos paradigmas da canção pop/rock. Tecem um mundo seu, elegante, subtil. E que, passados 34 anos, não parece agarrado a um tempo ou a um lugar… Ainda flutua…

“Garlands” e “Victorialand”, dos Cocteau Twins”, estão disponíveis em novas prensagens em LP em vinil, editadas pela 4AD. Ao invés da prensagem original que se apresentava a 45 RPM (por motivos técnicos de busca de uma fiel reprodução) a nova reedição de “Victorialand” roda a 33 1/3 RPM.

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