Um caminhada entre os espíritos da floresta, com Pantha du Prince

Quatro anos depois de “The Triad”, o músico alemão Henrik Weber volta a apresentar um disco pelo seu alter ego Pantha du Prince. Desta vez leva-nos numa viagem de sensações tranquilas através das paisagens (e dos seres) de uma floresta. Texto: Nuno Galopim

 

Há nomes aos quais não resisto sempre que sei que têm um novo disco a chegar. E Henrik Weber é um deles (e até hoje nunca desiludiu, antes pelo contrário). Mencionando o nome, tal como acabo de o fazer pode não fazer soar nada em particular a um primeiro contacto… Mas se acrescentar que, em disco (e nos palcos), o conhecemos sobretudo sob o alter ego Pantha du Prince, então o cenário muda de figura. Dos ensaios pelo tecno minimal que registou em Diamond Daze (2004) ou no soberbo This Bliss (2007) à procura de ecos de um lugar e da sua narrativa em Black Noise (2010), juntando depois o progressivo interesse pelo trabalho de colaboração com outros músicos (que o juntou já a Panda Bear ou ao coletivo The Bell Laboratory) e que gerou discos mais recentes como Elements of Light (2010) ou The Triad (2016), o percurso de Henrik Weber tem-no transportou-o de um patamar original de existência mais solitária (tão característico em quem trabalha nos espaços da música eletrónica) a um terreno de labor colaborativo que, agora em Conference of Trees, conhece um novo episódio ainda maior e mais arrebatador.

No ponto de partida está uma relação com um espaço. Neste caso a floresta. Um espaço de tranquilidade, de redução dos níveis de agitação da vida social e urbana até um nível de entendimento orgânico com os que ali habitam. Um espaço inspirador. Que pode ser motivo para abrir os sentidos e saborear o que está ali em volta. Desde criança Henrik pensava nas florestas como lugares habitados por seres imaginários. E hoje reconhece que, mais dia menos, dia, o seu destino seria o de um dia morar numa floresta. E assim poder perder-se, para se reencontrar, num lugar onde as leis do mundo natural falam mais alto…

Quando editou Black Noise falei com ele sobre como a música pode traduzir a experiência de um lugar. A capa do disco mostrava uma pintura com uma paisagem alemã do século XIX que corresponde à memória remota de um local semelhante a outro, do qual surgem fotografias no inlay do disco. As fotografias, por sua vez, correspondem a memórias de uma montanha, na Suíça, onde gravou o disco, lugar que, há mais de cem anos (nos tempos da pintura da capa), assistiu a um desabamento que levou sinais de destruição a uma paisagem que, entretanto, a natureza recompôs. “Hoje, mais de 100 anos depois do desabamento a montanha é linda. Nem dá para imaginar… A natureza reconquista sempre. É um pouco assim que a música deve funcionar… Cresce por si, tem uma face orgânica que desenvolve em nós algo novo, abre novas perspetivas”, contou-me então.

Sem a carga de devastação da história por detrás das imagens e da música de Black Noise, o novo Conference of Trees não deixa de partilhar com esse mesmo álbum um mesmo sentido de encantamento pela relação não apenas entre o espaço em volta e a música que nele pode emergir, mas igualmente o modo como a composição pode traduzir esse sentido de renascimento e de abertura de novos horizontes e perspetivas. O álbum “florestal” que Henrik Weber agora apresenta como Pantha du Prince partiu da soma de novos timbres à sua música, nomeadamente madeiras, pedras e sinos russos que recentemente descobriu. Na base de tudo está a matriz eletrónica que define o solo dos acontecimentos. Mas depois juntam-se ainda marimbas, vibrafone, sinos, violoncelo… Se o ponto de partida da composição foi um ato solitário (numa casa no meio da floresta), já a gravação chamou uma família de outros músicos para, tal como numa floresta, criar uma paisagem que respira no fim como um organismo comum.

O alinhamento de Conference of Trees parte de uma primeira sequência de faixas dominadas por ambientes de maior placidez ambiental. E, aos poucos, a pulsação viva dos corpos ganha expressão, emergindo ritmos e melodias, um pouco como se as árvores começassem não só a falar mas até mesmo a dançar. A experiência de audição sugere um percurso de imersão gradual em paisagens desenhadas por sons, num caminho com sentido definido e uma rota quase narrativa (na verdade mais cenográfica) desenhada pela evolução das faixas, umas após as outras. As imagens já criadas para acompanhar a música estabelecem, por sua vez, ligações evidentes a velhas memórias de seres imaginários que o músico lembra dos seus tempos de criança. O disco traduz sinais de evidente progressão tendo por base várias experiências anteriores. Mas, como a experiência conjunta, é talvez o mais envolvente de todos os discos até aqui apresentados como Pantha du Prince.

 

“Conference of Trees”, de Pantha du Prince, está disponível em LP, CD e nas plataformas digitais, numa edição da BMG.

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