Dez discos que definiram o meu gosto – Luís Oliveira

Cada disco pode contar várias histórias. E quem quiser mais do que ficar olhar para as capas pode agora ler aqui… Dez discos… e as respetivas histórias. E assim nasce o gosto de cada um. E hoje quem partilha aqui os seus dez discos e as respetivas memórias é o Luís Oliveira.

Acabei por ceder ao convite do Nuno Galopim por ser um convite do Nuno Galopim. Para mim, funciona quase como uma intimação. Tenho visto muitas listas por aí mas ESTA NÂO É A LISTA DOS MEUS DISCOS FAVORITOS. Essa lista muda todos os dias. Formar (e deformar) o gosto é algo muito diferente. Durante muitos anos, entendi que o que me definia o gosto ( e tanto mais) era  música que eu gostava. Hoje percebo que o que o define é TODA a música que gosto e não apenas a que eu gosto.Agora que penso melhor, também a próxima lista corre o risco de mudar todos os dias.

José Afonso “Ao Vivo no Coliseu”

(1983)

A primeira vez que ouvi um disco de José Afonso dei por mim a cantar parte das letras ou a reconhecer grande parte das melodias. A explicação era simples. Fora embalado com o canto paternal das diferentes canções de Coimbra e a minha infância e adolescência estava preenchida pelo assobio caseiro de Venham Mais Cinco ou um trautear descontraído de Vejam Bem. No fundo, as canções do Zeca foram o meu primeiro disco mesmo antes de ter qualquer disco que pudesse chamar de meu. 

Bruce Springsteen  “Born in the USA” 

(1984)

Qualquer coleccionador com uma colecção digna do nome já comprou um disco pela sua capa. Antes de chegar aos dois dígitos no BI, a capa de Born in The USA era a que mais me impressionava. Umas calças de ganga gastas, um cinto que nunca encontraria nas lojas de roupa para crianças que me abasteciam e uma bandeira que mais do que de um país era já de uma ideia de um país.O disco fazia parte da colecção dos primos mais velhos e era mesmo isso que significava. A música que os mais velhos ouviam. E que eu queria, à força, perceber. Springsteen tornou-se um dos meus artistas favoritos e a relação que estabeleci com auto-estradas que nunca iria percorrer ou passagens que desconhecia de todo é um dos testemunhos pessoais mais fortes que conheço do poder da música.

GNR “In Vivo”

(1990) 

Arranque dos 90’s. Lá por casa, os dias de confinamento forçado significavam apenas que estava a chover e que o pátio estava interdito para os habituais pontapés na bola. A alternativa era inventar novos jogos. Um Subbuteo com tampas Bic, peças de xadrez e um botão como bola; uns matraquiilhos já empenados por estarem fora do prazo de validade. Outra coisa qualquer. In Vivo foi banda sonora de muitas dessas tardes. Por mais que ache hoje Reininho um dos maiores poetas portugueses vivos, confesso que a cassete era mais vezes puxada atrás para ouvir a versão de Runnaway ( Del Shannon) do que para perceber as subtilezas de Morte ao Sol. Demorei vários anos para perceber quem eram os “sete rapazes da Avenida de Roma” a quem Reininho dedicou o Dunas.

Pedro Abrunhosa “Viagens”

(1994)

É o único que CD que tenho que se estragou de tanto uso. Comprado na Roma Mega Store do Porto com direito a autógrafo na capa. Obviamente, não era só a música. Era aquele tipo sempre de óculos, aquelas roupas, os “moves”, um certo mistério. E sim, uma música  entre o rap e um canto torto e as letras que punham o sexo onde havia poucas drogas e nenhum rock and roll. Só muito mais tarde tive essa consciência mas, é um disco ariete. Sem ele, para mim, não haveria Da Weasel, Mind da Gap, Jazzmatazz, US3, Digable Planets…

Nirvana “MTV Unplugged”

(1994)

Chegar aos Nirvana via MTV Unplugged é, um pouco, como só ter visto Lucho Gonzalez jogar de azul e branco na sua segunda passagem pelo Dragão. Continua a ser incrível mas não é a mesma coisa. Mas as coisas são como são e o tempo não anda para trás. Depois foi tempo de recuperar o tempo perdido e perceber o momentum… Demorou muito mais tempo para perceber que aquele rapaz loiro e magro com quem as raparigas queriam estar e que os rapazes queriam ser era bem mais do que um arruaceiro que não se integrava nem se queira integrar. São canções incríveis. Desligadas da corrente ou na máxima voltagem.

The Clash “The Vanilla Tapes”

(extra de uma reedição de “London Calling” em 2009)

Nunca tinha lido tanto sobre um conjunto de canções sem as ter nunca ouvido e obviamente… foi uma desilusão tremenda. Ainda hoje tenho o disco como um dos melhores kicks de energia à disposição no mercado de audiogésicos, como diria a minha amiga e colega Dr. Ana Correia. Para ser franco, em vez de pensar na senhora Thatcher ou o melting pot Londrino do arranque dos 80, continuo a romancear com os armazéns estúdios DIY, o génio louco de Guy Stevens, a ética e a estética de Joe Strummer.

Bob Dylan “Highway 61 Revisited” 

(1965)

Às segundas, Blonde on Blonde é o meu disco favorito de Dylan. Às Terças, passa a ser Time Out Of Mind. Às Quartas, Blood on the Tracks. Quintas estão reservadas para Freewheeling. Sexta é dia de Modern Times. Aos fins de semana… pode ser um qualquer.cMas Highway 61 Revisited foi uma revelação. Não pensava que um poema como Desolation Row pudesse caber numa canção e ainda hoje acho que o tema título foi escrito pelo diabo, em pessoa. Ainda hoje não sou capaz de ouvir Like a Rolling Stone sem gritar rouco e desafinado “How Does it Feel” e tenho absoluto desprezo pelo tal de Mr. Jones. O senhor Zimmerman tornou-se o “meu melhor amigo que nunca conheci” e, para mim, um dos maiores artistas que alguma vez calcorreou o Planeta Terra. Acho que não é a amizade a falar…

Miles Davis “Kind of Blue”

(1959)

Como um outro qualquer adolescente imberbe, cresci com a convicção clara que nunca ouviria jazz na via. Que era uma coisa burguesa. E velha. De quem já tinha desistido. De quem não queria mais aventura, perigo ou agitação na vida. Tudo errado, claro.Não sei bem porque Kind of Blue é uma obra prima mas é uma obra prima. E deste que a descobri passei a querer muito Miles.

Caetano Veloso “Livro” 

(1997)

Para além das novelas e de Romário, cheguei ao Brasil exactamente 500 anos depois de Cabral. Foi um curso intensivo que ainda hoje dura. Começou com as novas amizades proporcionadas pela Universidade e passou pela  Rádio Nova onde o Jorge Costa, o José Mário Brandão, o Joaquim Mota e o Filipe Gomes me iam levando do Rio ao Piauí.
Tal como em exemplos anteriores, este não é o meu Caetano favorito mas foi um belíssimo mestre de cerimónias para que percebesse onde o Rio é mais Baiano.

Wilco “Yankee Hotel Foxtrot” 

(2002)

Lembro-me que comprei este disco na “defunta” Jojo’s na Rua de Cedofeita. Lembro-me que o Porto venceu o Vitória de Guimarães por 2-0 nesse mesmo dia. Lembro-me de ter descoberto os Wilco com o Miguel Quintão nas tardes da Voxx. Lembro-me de ter sido banda sonora de um desgosto amoroso futuro (sem razão aparente). Mas são as canções ora tortas ora perfeitas saídas da pena de Jeff Tweedy que garantem um lugar de caras nesta lista.

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