Estreado em 1974 o filme musical de Brian de Palma “O Fantasma do Paraíso” precedeu “Rocky Horror Picture Show” e abriu caminho à criação de óperas rock para o grande ecrã (para além das que tinham já começado a surgir nos palcos de teatro). Texto: Nuno Galopim

Projetando em ambiente de ópera rock ecos da trama de O Fantasma da Ópera (que antes dos palcos, era um romance de Gaston Leroux originalmente publicado em 1910), mas juntando o ingrediente da busca da eterna juventude, que habita muitas histórias, desde a Trágica História do Doutor Fausto de Christopher Marlowe, O Fantasma do Paraíso é um filme musical dos anos 70 que, apesar da fraca bilheteira conquistada na altura, acabou por conquistar um lugar na história do cinema musical como uma peça de culto. Não alcançou nunca a dimensão cultural (e popular) de Rocky Horror Picture Show (que surgiria meses depois, já em 1975), filme que levou bem mais longe os temperos glam rock com os quais O Fantasma do Paraíso tem apelas um discreto flirt (sobretudo centrado na construção caricatural da figura flamboyant de Beef). Mas de certa forma foi neste filme de Brian de Palma que a cultura pop/rock gerou uma ideia de ópera rock expressamente direcionada para o cinema. Musicais como Hair ou Jeus Christ Superstar eram já sucesso nos palcos há alguns anos, e este último tinha chegado ao cinema em finais de 1973 (Hair teria a sai versão para cinema mais tarde). O Fantasma do Paraíso nasceu no ecrã, com argumento assinado pelo próprio Brian de Palma e contando com música inédita criada por Paul Williams, autor com obra cantada em vozes que vão de uns Carpenters a Barbara Streisand, e de quem David Bowie tinha já cantado Fill Your Heart em 1971.
O Fantasma do Paraíso conta a história de um compositor (talentoso) que levou anos a compor uma cantata, que não é mais do que a sua abordagem a Fausto. Swan (curiosamente interpretado por Paul Williams, o autor das canções), um produtor de grande sucesso – fazedor de carreiras e êxitos – escuta-o numa audição e encontra aí a canção que precisava para assinalar a abertura de uma nova sala de espetáculos: o Paradise. Usando o clássico “canto” do vigário, um dos ajudantes de Swan fica com a partitura, prometendo mundos e fundos a Winslow Leach, o compositor.
Esta é apenas o primeiro dos muitos truques que Swan usará para extorquir música a Winslow (e vale a pena notar que a tradução do apelido do compositor é sanguessuga, quando a sanguessuga aqui não é ele). As vinganças vão inevitavelmente acontecer (e não será preciso ter visto o filme ou lido uma sinopse para imaginar que ganharão forma na sala de espetáculos: o Paradise). Pelo caminho não falta a trama romântica, que se manifesta na forma de um encantamento de Winslow pela cantora para quem escreve as canções…



Se a trama é aparentemente ligeira (porque na verdade encerra em si vários planos de leitura sobre os meandros das indústrias musicais) e as personagens moldadas por linhas caricaturais, já a música traz aqui um dos ingredientes mais “sérios” ao filme, criando uma banda sonora (que foi editada em disco) com canções do calibre de outras que então nasceram em grandes musicais com alma de “ópera rock”. O trabalho na composição fotográfica (no registo pop mais pop não há) e uma alusão à ideia do espetáculo sem filtro (porque vale tudo até a morte), como dois anos depois seria abordada (com outro contexto) em Network, de Sidney Lumet.