Em 1967 Roberto Carlos estava ainda longe de ser o “rei” e o cantor romântico (identidade que começaria a ganhar forma na década de 70). Era uma jovem força do pop/rock made in Brasil, e juntou o cinema à sua forma de comunicar novas canções. Texto: Nuno Galopim

Antes de o tropicalismo ter promovido uma profunda e verdadeiramente revolucionária forma de estabelecer diálogos entre correntes na linha da vanguarda da invenção pop e sérias expressões de identidade da cultura brasileira outros espaços ensaiavam diferentes gestos de assimilação de modernidade entre os mais jovens músicos e públicos do Brasil. As fortes relações de proximidade vivencial e cultural com os EUA resultaram em expressões locais de primeiros mimetismos e olhares desde finais dos anos 50. Em meados dos anos 60, já com algumas primeiras experiências projetadas em discos e palcos, a cultura pop brasileira encontra num programa da TV Record o espaço de afirmação para um movimento talhado com mais sinais de personalidade. Surge assim a Jovem Guarda, entre qual militam nomes como os de Jorge Ben Jor ou Tim Maia e, naturalmente, os rostos conhecidos por serem os dos apresentadores do próprio programa: Roberto Carlos e Erasmo Carlos (que na verdade se chama Erasmo Esteves), que se revelariam uma das mais marcantes duplas autorais do emergente pop/rock brasileiro.
Em 1967 Roberto estava ainda longe de ser o “rei” e o cantor romântico (identidade que começaria a ganhar forma mais nítida na década de 70). Era uma jovem força do pop/rock made in Brasil, com uma história que passava pelos The Sputniks (banda na qual militou também Tim Maia) e tinha já lançado importantes álbuns a solo como “É Proibido Fumar” (de 1964, e em cujo alinhamento surgia “O Calhambeque”) ou “Jovem Guarda” (êxito significarivo em 1965 incluindo o tema “Quero Que Vá Tudo Para O Inferno”) quando se lança numa aventura que resolve somar a música às imagens. Depois de Elvis Presley e de Cliff Richard os Beatles tinham mostrado, sobretudo com os dois filmes realizados por Richard Lester, como o cinema poderia ser um poderoso aliado da divulgação não apenas das canções como da construção icónica de quem canta. E entre finais dos anos 60 e início dos anos 70 Roberto Carlos será o protagonista de três filmes realizados por Roberto Farias, trilogia de referência na filmografia do cantor e que deu os primeiros passos com “Roberto Carlos em Ritmo de Aventuras”, filme estreado de 1968 com banda sonora editada num disco homónimo lançado em finais de 1967.
Se no filme Roberto Carlos vive literalmente um regime de aventuras – piscando assim tanto o olho ao tom dos filmes dos Beatles como ao universo de James Bond que então começava a fazer escola – na música alia uma evolução natural dos trilhos pop/rock característicos do movimento da Jovem Guarda (acrescentando às coordenadas pop e rock algum travo colhido na música soul) a sinais de um tempo em que bandas e artistas por todo o mundo mergulharam as suas canções em arranjos mais complexos. Metais, cordas, flauta, um cravo, as teclas de um Hammond, são peças num jogo de timbres, cores e formas que, num disco que convocou a colaboração de músicos da banda Renato e seus Blue Caps ou do teclista de formação clássica Lafayette Limp. O disco gerou alguns temas clássicos e acompanhou imagens inesquecíveis da cultura pop brasileira como “Eu Sou Terrível” (que acompanha a sequência de abertura do filme, com ele mesmo ao volante) ou “Quando” (que mostra Roberto Carlos, acompanhado pela banda, numa performance no telhado de um prédio, antes de uma opção semelhante ter sido tomada pelos Beatles em janeiro de 1969). E é (juntamente com o apelo do filme) um dos mais marcantes da obra pop brasileira do pré-tropicalismo.
“Roberto Carlos em Ritmo de Aventura” teve edição original em LP pela CBS em 1967. No mesmo ano surgiu uma primeira edição internacional com o título em inglês “It’s Time For Love” com capa diferente e uma ordem diferente no alinhamento. A edição original portuguesa manteve o mesmo alinhamento da brasileira, tendo contudo optado por uma capa diferente. As edições em CD retomaram habitualmente a capa e alinhamento originais.