Um ano depois de um álbum dedicado a Debussy, que representou o momento de descoberta de Isao Tomita pelo mundo ocidental, o músico japonês propôs uma nova abordagem a terrenos da música clássica, desta vez visitando Mussorgsky. Texto: Nuno Galopim

Entre finais de 60 e inícios dos anos 70, claramente sob influência dos trabalhos recentes de Wendy Carlos e dos instrumentos criados por Robert Moog, o japonês Isao Tomita iniciou um percurso discográfico que tem nos seus primeiros títulos algumas peças que abriram primeiras frestas na história da assimilação das electrónicas pela música popular.
Em 1972, assinado como Electric Samurai, editou o álbum Switched on Rock, um conjunto de abordagens a canções dos Beatles, Elvis Presley ou Simon & Garfunkel. Coube contudo ao disco de 1974 Snowflakes Are Dancing (lançado no Japão como Clair de Lune) que editou já sob o seu nome, o feito de o colocar no mapa das atenções de uma nova música que começava a ganhar forma. Aí tomou peças de Debussy como ponto de partida, rearranjando-as com um teclado Moog. O disco teve grande impacte, e abriu caminho a outras explorações futuras nas quais a música do passado encarava assim desafios do presente com sabor a futuro. E logo um ano depois do disco com música de Debussy a atenção de Tomita apontou azimutes a Modest Mussorgsky.
Uma das mais reconhecidas manifestações do talento de Mussorgsky, é o conjunto de peças para piano que compôs em 1874 sob o nome como Quadros Numa Exposição, em homenagem ao seu amigo Viktor Hartman, artista e arquiteto, falecido um ano antes. Antigo estudante de Belas Artes em São Petesburgo, Hartman trabalhou essencialmente como ilustrador de livros e como arquiteto. As aguarelas e desenhos “livres” que deixou foram, na sua maioria, pintadas em viagem. De comum com a música de Mussorgsky, que conheceu em 1870, a pintura de Hartman revelava uma atenção por motivos tradicionais russos. A sua morte, causada por um aneurisma, em 1973, motivou uma exposição de perto de 400 obras suas em São Petesburgo um ano depois. E foi nessa exposição, e em quadros concretos, que Mussorgsky se inspirou para criar Quadros Numa Exposição.
Originalmente compostas ao piano, estas peças foram, já depois da morte do compositor, alvo de vários arranjos e adaptações. Mikhail Tushmalov foi, em 1886, o primeiro a assinar arranjos sobre estas peças. Mas coube a Maruice Ravel, em 1922, o arranjo que hoje é quase tido por canónico, tantas vezes que foi gravado e apresentado ao vivo desde então. Estes ‘quadros’ de Mussorgsky continuaram a atrair a curiosidade de músicos de outras gerações e géneros. Antes ainda da visão de Isao Tomita, em 1971 os Emmerson Lake & Palmer levaram a obra a disco. E, em 2002, Amon Tobin usou um fragmento da obra de Mussorgsky no seu álbum Out From Where.