Nasceu em Lisboa, em 1983. Cresceu e reside nas Caldas da Rainha. É músico dos Norton, banda de Castelo Branco, que este ano lançou “Heavy Light”. Durante dez anos foi jornalista da revista de bordo da TAP, a UP. Em 2020 fundou a Ticket To Ride Records. Hoje fala-nos dos seus discos.

Qual foi o primeiro disco que compraste?
Foi o “Trompe Le Monde” dos Pixies, em CD, numa loja que se chamava Magic Som, nas Caldas da Rainha, com o dinheiro da minha mesada. Tinha nove anos e conheci o disco através de um vizinho cuja música que ouvia me chegava a casa de tão alto que estava. Tive que lhe ir perguntar o que era. Ainda é um disco de que gosto muito e que só faz sentido ser ouvido de uma ponta à outra. 15 canções sem espinhas, em meia-hora. Perfeito! Para mim, o melhor dos Pixies.
E o mais recente…
Foram quatro: “Odelay” do Beck, “Every Good Boy Deserves Fudge” dos Mudhoney, e “Sun Oddly Quiet” do João Pais Filipe, comprados na minha última visita aos meus queridos amigos da Louie Louie, em Lisboa. No mesmo dia, depois de ter chegado a casa, comprei o novo álbum do Thurston Moore, em cassete, mas online.
O que procuras juntar mais na tua coleção?
Acima de tudo, discos de que eu gosto e com os quais crio uma relação pessoal. Do rock à electrónica, passando pelo hip hop, pelo jazz e pela música improvisada, interessa-me, sobretudo, a música e, muitas vezes, as histórias por detrás dos discos e a forma como eu os associo a pessoas e a momentos. Além do LP, sou fã de singles porque oferecem novas capas e lados B que, na maior parte das vezes, são obrigatórios.
Um disco pelo qual estejas à procura há já algum tempo.
O “Wammo” dos Bailter Space, em vinil. São da Nova Zelândia e fazem parte de um naipe que pertence a uma editora desse país, a Flying Nun. Este ano tenho descoberto imensas bandas interessantes associadas à editora. Também procuro o maxi original do “Dream Baby Dream” dos Suicide a um preço mais acessível e em bom estado. Ah! E um maxi dos Silver Jews, do single “Tennessee”, para que possa completar a minha colecção deles (as outras três canções são muito boas).
Um disco pelo qual esperaste anos até que finalmente o encontraste.
O “London Weekend” dos Another Sunny Day, em vinil. Lembro-me de encontrar a versão em CD bem mais cara do que a do vinil, há uns 15 anos, no eBay. Os tempos mudaram bastante! Foi lançado pela Sarah Records, uma editora independente cujo estatuto é bem maior do que aquele que lhe é reconhecido e de que adorava ter todos os discos (tenho alguns, mas poucos). Talvez um dia dê o mergulho nessa perdição.
Limite de preço para comprares um disco… Existe? E é quanto?
O limite são os 30 euros, embora esse valor já seja um pouco demasiado para mim. Mas, por vezes, há “aquele” que me faz repensar o limite auto-imposto e que me convence a excedê-lo. Depende sempre das possibilidades num determinado momento.
Lojas de eleição em Portugal… E lá fora?
Em Portugal, elejo a Louie Louie, a Flur, a Groovie Records e a Discolecção, em Lisboa, e a Matéria Prima, a Porto Calling e a Vinyl Disc, no Porto. Tenho muita curiosidade em conhecer a Lucky Lux, em Coimbra. Está para breve. Lá fora: a Flashback de Islington, em Londres, a Disk Union de Shimokitazawa, em Tóquio, e a Joint Custody, em Washington, DC.
Na passagem dos Norton pelo Japão aproveitaste para ir a lojas de discos?
Sim! Trouxe discos que nunca pensei encontrar na vida e a bons preços. Em Tóquio, estivemos na Tower Records, em Shibuya, mas foi na Disk Union de Shimokitazawa que perdi a cabeça. Estávamos a passear pelo bairro depois do soundcheck e cruzámo-nos com a loja. Curiosamente, até encontrámos um disco do Sérgio Godinho. O Pedro teve que me emprestar dinheiro porque eu tinha deixado a carteira no camarim. Voltei lá depois do último concerto que demos. Tínhamos chegado a casa já de manhã e eu tentei dormir, mas não consegui. Saí e segui as indicações que o baixista dos Tendouji, uma das bandas com as quais partilhámos palco nessa digressão, me deu para chegar à loja a partir do apartamento onde estávamos alojados. Quando regressei, ainda estavam todos a dormir e foi aí que o meu sono pegou.
Compras discos online?
Sim. O Discogs é uma visita constante, e até demasiadas vezes, para discos em segunda mão. Também gosto do site Juno (sempre impecáveis). Mas, principalmente, faço compras online quando não encontro os discos que procuro nas lojas. Faço questão de comprá-los nas lojas locais e contribuir para que elas não deixem de existir. Esse apoio é cada vez mais importante e não há nada como estar numa loja de discos.
Que formatos tens representados na coleção?
LP, 12”, 10”, 7”, CD e cassete.
Os artistas de quem mais discos tens?
Dos Sonic Youth tenho praticamente tudo, em LP, 12”, 10”, 7”, CD e cassete. Tenho alguns dos álbuns nos três formatos. A minha colecção vai além da discografia oficial da banda, incluindo colaborações, bootlegs e uma série de discos dos projectos paralelos do Thurston Moore, da Kim Gordon, do Lee Ranaldo e do Steve Shelley. Todos os anos há sempre qualquer coisa relacionada com os Sonic Youth que compro ou procuro. É uma colecção que permanece incompleta, mesmo que pareça o contrário nas minhas prateleiras. Os outros artistas de quem tenho mais discos são os Belle & Sebastian, The Fall, Yo La Tengo, Pavement, The Pastels, Death Cab For Cutie, Fugazi e Unwound.
Editoras cujos discos tenhas comprado mesmo sem conhecer os artistas…
Quando era adolescente, e a Internet ainda estava longe de ser como a conhecemos, comprava tudo das editoras independentes portuguesas Bee Keeper, LowFly Records e Garagem, mesmo sem conhecer os artistas. Havia essa confiança e também a noção de que estava a adquirir uma peça única. Hoje é simples picar um disco para que se possa desvendar um pouco daquilo que oferece. No entanto, há editoras cujos lançamentos me chamam a atenção e me fazem investigar sempre: Drag City, Slumberland, K, Kill Rock Stars, Dischord, Matador, Sub Pop, Numero Group, Upset The Rhythm, Holuzam, Table Sports, Skud & Smarty, Hatsize, Cafetra, Xita e Spring Toast.
Uma capa preferida
Gosto muito de fotografia, nomeadamente de retratos, por isso vou eleger três capas: “Love Tara” dos Eric’s Trip, “Drop Out” dos East Village e “Gentlemen” dos Afghan Whigs. A capa deste LP foi inspirada numa fotografia lindíssima da Nan Goldin.
Um disco do qual normalmente ninguém gosta e tens como tesouro.
Não é que ninguém goste, mas, quando se fala dos Pastels, o “Illumination” é mencionado poucas vezes. É o último disco antes de um longo período sem editarem e o meu preferido da discografia. Talvez porque foi o primeiro que conheci deles e porque tinha 15 anos, quando os sentimentos estavam à flor da pele. Comprei o álbum completamente às escuras. Bastou-me apenas saber que eram uma referência na comunidade indie. Não tenho problemas em dizer que mudou a minha vida. Abriu-me um leque de possibilidades para poder compreender e chegar a tantas outras bandas. Tenho em CD e, há poucos anos, comprei o LP. O disco tem o selo da Domino, que hoje tem pouco a ver com o catálogo de então, que era excepcional.
Como tens arrumados os discos?
Por ordem de compra. Já alfabetizei, mas o caos instalou-se com as mudanças de quarto. No entanto, gosto desta arrumação porque permite-me descobrir outros discos enquanto procuro um em específico. Dá-me um prazer tremendo passar o tempo assim.
Um artista que ainda tenhas por explorar…
Todos os anos dedico-me a artistas que ainda não tinha tido a oportunidade de descobrir. Em 2020 conheci a discografia do Epic Soundtracks, baterista dos Swell Maps. O primeiro álbum a solo chama-se “Rise Above” e é precioso! Tem uma série de ilustres convidados, como o J Mascis, o Lee Ranaldo, a Kim Gordon e o Rowland S. Howard. Em breve, nos meus planos, conto explorar os Neu!, de que conheço bem melhor os discos do Michael Rother, e os Swans. E ainda dois mestres da guitarra, o John Fahey e o Derek Bailey.
Um disco de que antes não gostasses e agora tens entre os preferidos.
Quando conheci os Hüsker Dü, comecei pelo “Candy Apple Grey”, um disco cuja sonoridade é bem mais acessível do que a dos anteriores, mais crus e mais agressivos. Talvez por isso o “New Day Rising” me tenha custado a entrar. Foi depois de ter ouvido o “Zen Arcade” (o meu preferido), anterior a esse, que tudo me fez mais sentido. Está em terceiro no meu top Hüsker Dü.
Dos discos dos Norton há algum (ou alguns) que se tenham tornado raridade(s) mais procuradas?
O nosso disco de remisturas, “Frames – Remixes & Versions”, é único que não foi editado por nós. Tem o selo de uma antiga editora lisboeta, a Transformadores, e é daqueles que já não conseguimos encontrar por aí. As edições japonesas de três dos nossos discos também podem ser consideradas raridades. Assim como o nosso disco homónimo, cuja versão em vinil, numerada a 300 exemplares, esgotou há poucos meses.
Há discos que fixam histórias pessoais de quem os compra. Queres partilhar um desses discos e a respectiva história?
A compilação “Teenagers From Outer Space – The Do It Yourself Pop Explosion”, editada pela Bee Keeper e pela Milkshake, foi o primeiro disco que comprei em vinil. Foi logo quando saiu, em 1996. Ainda nem tinha gira-discos! Levei o LP para casa do meu vizinho para o poder ouvir e para que ele mo gravasse em cassete. Descobri ali um universo muito especial, criado pela Elsa Pires e pelo Luís Futre. Se os Pinhead Society que, na altura, tinham todos 15 anos, me deram vontade de escrever as minhas canções, o “Teenagers” ensinou-me que qualquer pessoa podia fazer um disco. Toda aquela estética está muito presente no que fiz e faço na música. A partir dali, devorei cada cassete da Bee Keeper, incluindo os CDs e os 7” que se seguiram. Fui amigo da Elsa e continuo amigo do Futre e do Fred, que tanta música me dão a conhecer. A Bee Keeper foi o grande elo entre mim e muitos músicos com quem mantenho contacto. Dois deles, que tocavam nos Alien Picnic, estão comigo nos Norton. O ano passado colaborei na edição de um disco de homenagem à Elsa e a todo aquele mundo único que ela construiu. O “Teenagers From Outer Space Comeback – A Tribute To Bee Keeper” trouxe de volta várias bandas e músicos que pertenciam ao catálogo da “colmeia”, com temas novos e gravados de propósito para a ocasião. Foi muito bom poder fazer parte de tudo isto, tanto agora como há 25 anos.

Um disco menos conhecido que recomendes…
“A Certain Smile, A Certain Sadness” dos Rocketship. Indie pop do futuro, entre os My Bloody Valentine e os Stereolab. Doce como o mel!
Pá! És um verdadeiro “sacerdote” do indie-rock em terras lusas! Abraço
JD
GostarGostar