Continuo apresentar as listas dos melhores de 2020. Hoje falo do que vi em cinema e em televisão. Naturalmente destacando a música. Mas referindo ainda a ficção, outros documentários e as edições em home vídeo. Escolhas e textos: Nuno Galopim
FILMES SOBRE MÚSICA: “David Byrne’s American Utopia”, de Spike Lee
Criar um filme-concerto pode ser muito mais do que conceber e gerir uma família de câmaras no momento da captação de uma atuação (habitualmente a decorrer num palco). O realizador e a sua equipa podem assim olhar o detalhe, colocar-nos perante pontos de vista que seria impossível de vermos caso estivéssemos sentados na plateia a assistir. E pode ainda, a partir da música e das palavras que emanam do palco, construir um discurso que assim ora acentua a comunicação ou pode até vincar ou destacar elementos e, assim, criar uma segunda camada de leitura… Spike Lee faz tudo isto ao levar o espetáculo American Utopia, de David Byrne, do “pequeno” Hudson Theatre, na Broadway (na verdade a porta fica na rua West 44) para o mundo dos ecrãs. Mas a verdade é que em David Byrne American’s Utopia, o filme que o realizador assina, há uma realidade que antecede todo o trabalho de Spike Lee e daqueles com quem trabalhou neste projeto. Há um espetáculo. Um grande espetáculo. E que é mais do que um concerto.
Além deste documentário destaco estes outros nove (por ordem alfabética). Na sua maioria foram exibidos em festivais de cinema entre nós:
“Aznavour Por Charles”, de Marc di Domenico
“Beastie Boys Story – A Live Documentary”
“Caos e Afinidade”, de Pedro Gonçalves
“Dark City: Beneath The Beat”, de TT The Artist
“PJ Harvey: A Dog Called Money”, de Seamus Murphy
“Soa”, de Raquel Castro
“The Heart is a Drum”, de Jacob Frössén
“Welcome To The Dark Ages”, de Paul Duane
“White Riot”, de Rubika Shah
FICÇÃO: “A Verdade”, de Hirokazu Koreeda
Com uma carreira já considerável (e notável) o japonês Hirokazu Koreeda experimentou uma primeira produção internacional e a coisa não podia ter corrido melhor, contando com um elenco onde brilham Catherine Deneuve, Juliette Binoche e Ethan Hawke. Um luxo! “O Oficial e o Espião”, de Roman Polanski foi outro caso notável do ano. E vale a pena não deixar de referir o magnífico “Tenet”, de Christopher Nolan, um dos raros filmes de grande orçamento que conseguiram manter em 2020 a sua estreia em sala (mesmo em data adiada face ao originalmente previsto). “The Trial of The Chicago 7”, de Aaron Sorkin, é um belo exemplo, por sua vez, da produção a ser criada para as plataformas de streaming.
Além do filme de Koreeda, a minha lista dos melhores de 2020 inclui ainda, por ordem alfabética:
“Dark Waters”, de Todd Haynes
“Mank”, de David Fincher
“O Adeus à Noite” de André Techiné
“O Caso Collini”, de Marco Kreuzpaintner
“O Oficial e o Espião”, de Roman Polanski
“Tenet”, de Christopher Nolan
“The Trial of The Chicago 7”, de Aaron Sorkin
“Uma Vida Escondida”, de Terrence Malick
“Verão de 1985”, de François Ozon
OUTROS DOCUMENTÁRIOS: “Honeyland”, de Tamara Kotevska e Ljubomir Stefanov
Um extraordinário exemplo de cinema-verdade, com a história (real) de uma apicultora que trabalha o mel com técnicas e sabedorias ancestrais, algures nas montanhas da Macedónia do Norte, e repara depois como a harmonia do seu mundo é afetada pela chegada de uma caótica família nómada. À dimensão narrativa (assombrosa) junta-se um trabalho notável na direção de fotografia e na montagem. O ano de documentários acolheu vários títulos, dois deles mangíficos ensaios sobre memórias dos tempos da II Guerra Mundial. Além de “Honeyland”, de Tamara Kotevska e Ljubomir Stefanov, a minha lista do que de melhor vi este ano inclui:
“Para Sama”, de Waad al-Kateab
“Quem Escreverá a Nossa História?”, de Roberta Grossman
“Uma Vida Alemã”, de Christian Krönes, Florian Weigensamer, Roland Schrotthofer e Olaf S. Müller
“Zé Pedro Rock’N’Roll”, de Diogo Varela Silva
SÉRIES: “Pátria”
Como retratar um conflito maior (em concreto a ação terrorista da ETA e o seu fim de operações) segundo um ponto de vista vivencial e familiar? Esse é o ponto de vista da brilhante série “Pátria”, baseada no livro homónimo de Fernando Aramburu e que a HBO exibiu este ano. Do melhor do ano de ficção para televisão há que destacar ainda “The Mandalorian”, série da Disney + baseada no universo Star Wars e que, na segunda temporada, mostrou ser capaz de não só acrescentar novidade e surpresa a este mundo de ficção como integrar e ligar a ação em curso a elementos de várias outras frentes de criação deste mesmo espaço originalmente imaginado por George Lucas nos anos 70. Mais até do que os filmes recentes, em “Mandalorian” está a chave maior da reativação e capacidade de renovação do universo Star Wars. O ano inclui ainda “Devs”, mais um belo exemplo das visões sci-fi com bom argumento e cuidada direção artística de Alex Garland.
“Devs”
“Industry”
“The Crown” (T4)
“The Mandalorian” (T2)
DVD / BLU-RAY: “It Couldn’t Happen Here” de Jack Bond
Estreado em 1988, o filme de Jack Bond “It Couldn’t Happen Here” criou um arco narrativo e um conjunto de personagens em torno de canções dos dois primeiros álbuns dos Pet Shop Boys. O filme foi restaurado e está agora editado em Blu-Ray e DVD. E a resposta foi tal que a edição especial (com um Blu-Ray, um DVD e um livro de 50 páginas repleto de fotos e bons ensaios) esgotou num ápice. Uma segunda edição, standard, chegou depois… Vale a pena pelo encontro com a cópia restaurada do filme. Mas é pena se o livro (bem melhor do que os extras) ficar excluído… Dos extras vale a pena notar a inclusão do teledisco de Always On My Mind, realizado por Jack Bond a partir de uma colagem de momentos do filme. O realizador voltaria ainda a trabalhar com os Pet Shop Boys no teledisco de Heart. Além desta edição, destaco ainda:
“Laurel Canyon”, de Allison Elwood
“Sleep”, de Natalie Jones