Quem são os Måneskin, o grupo italiano que venceu a Eurovisão?

Já com dois álbuns editados, os italianos Måneskin triunfaram em Roterdão ao som de uma visão glam rock de travo pesado. O seu mais recente disco chama-se “Teatro d’Ira – Vol. 1” e inclui a canção que lhes deu a vitória em San Remo e na Eurovisão. Texto: Nuno Galopim

E de repente há um nome que não chega do departamento britânico, norte-americano ou canadiano a despertar atenções no mapa pop/rock de 2021. Teria acontecido o mesmo com a francesa Barbara Pravi ou o suíço Gohn’s Tears, caso a vitória na 65ª edição do Festival Eurovisão da Canção lhes tivesse sorrido. Na verdade, tanto a cantora francesa e o jovem suíço, juntamente com o grupo ucraniano Go A, os islandeses comandados por Dadi Freyr ou as cantoras Manizha (Rússia) e Victoria (Bulgária) são vozes que agora vale a pena acompanhar com atenção (e o mesmo o dirão lá fora os muitos que descobriram os portugueses Black Mamba). Mas hoje falemos dos vencedores, até porque chegaram a Roterdão já com um novo álbum, precisamente editado por alturas da sua vitória em San Remo.

         Antes de mergulharmos no novo disco dos Måneskin vale a pena lembrar que a colheita de San Remo dos últimos anos tem sido fértil em boas revelações (para quem vive fora de Itália, entenda-se). Dos Lo Stato Sociale (grande revelação de 2018) aos Eugenio in Via di Gioia (2020) não faltaram momentos de (boas) surpresas, cabendo talvez a melhor de todas a Mahmood que, em 2019, venceu em San Remo para levar Soldi a um segundo lugar em Telavive (que na verdade deveria ter sido o primeiro, mas os votos é que decidem as coisas nesse departamento).

         Vêm de Monteverde, um bairro de Roma que não será exatamente problemático. Antes pelo contrário. Mas se com os Strokes ninguém se importava de estar perante uma banda nascida entre filhos de famílias abastadas, não vamos achar que isso agora é um problema. Ou temos complexos de classe?

         Avancemos assim sendo… Surgiram há já uns anos em ambiente escolar. Juntam três italianos e uma italo-dinamarquesa: Damiano David (voz), Victoria De Angelis (baixo), Thomas Raggi (guitarra) e Ethan Torchio (bateria). Um ano depois de reunidos em quarteto e de terem encontrado o nome por ocasião de um concurso, começaram por dar nas vistas no programa Fator X, no qual participaram em 2017, terminando essa temporada em segundo lugar. De um acordo discográfico nasceu Chosen, um EP de estreia que mostrava ainda mais possibilidades do que certezas. O rock era já a carne da sua música, mas os corpos das canções revelavam sobretudo aventuras animadas por malhas funk e marcas da cultura hip hop surgiam aqui e ali na voz de Damiano. As canções eram ainda sobretudo cantadas em inglês, mostrando o percurso do grupo uma rota de progressiva construção de uma identidade na cada vez mais expressiva quantidade de canções em italiano nos discos seguintes. Editado em 2018 o álbum de estreia Ballo della Vita deu-lhes outra visibilidade, sobretudo conquistada por canções como a elegante balada Torno a Casa ou Morirò da Ré, esta mais próxima dos diálogos entre o rock e o funk que estão na génese do som do grupo. O travo pop com tempero latino de L’Altra Dimensione, o flirt com o reggaeton em Are You Ready ou o diálogo com o hip hop emou Immortale (com Vegas Jones) abriam interessantes horizontes de possibilidades. Mas foram as opções mais próximas de linguagens rock em Fear For Nobody que acabariam por lançar as pistas para a etapa seguinte, que em 2021 os levaria à Eurovisão.

         Com um primeiro aperitivo revelado (ainda em 2020) em Vent’Anni, o segundo álbum dos Måneskin surgiu logo depois da vitória de Zitti e Buoni em San Remo e abriu um novo ciclo ao qual chamaram Teatro d’Ira. O disco não omite a presença do inglês, que agora está claramente reduzido a dois breves episódios. Porém é na forma como a língua italiana encontra relações com as linguagens rock que na verdade se desenham os traços mais característicos da música dos Måneskin. Sem a amplitude da diversidade de caminhos experimentados no álbum anterior, o disco surge mais focado em opções hard rock, menos estimulantes quando cantadas em inglês, mais dotadas de personalidade quando se juntam a ecos glam (sobretudo sugeridos pela androginia dos corpos) e a um design pensado ao detalhe que vinca igualmente outra das opções artísticas de um grupo que soube dominar a arte de comunicar música e imagem através da televisão (aquela expressiva votação popular não é senão expressão disso mesmo… e também de algumas passagens pelo “livro clássico da rebeldia, volume 1”). Com apenas 29 minutos de duração (aplausos aqui) Teatro d’Ira – Vol 1 não é um disco tão estimulante quanto o era o anterior Il ballo Della Vita. Convenhamos que, além do eficaz e contagiante glam rock em modo “pesado” de Zitti e Buoni (que é como quem diz “quietos e caladinhos”), o melhor do disco surge não nos temas que sugerem mais incursões pelo hard rock, mas em Coraline (com mais contrastes) ou o elegante Vent’Anni (que encerra o alinhamento). Se, animados pelo impacte da vitória na Eurovisão, os Måneskin acharem que é no espaço mais fechado do hard rock que está o seu futuro talvez valha a pena fazer-lhes notar que não nasce todos os dias um Zitti e Buoni… Porém, se entenderem o poder da surpresa e da adaptabilidade do seu som (e imagem) ao leque mais vasto de ideias que já escutávamos no álbum de 2018, então a coisa poderá valer a pena.

“Teatro d’Ira” dos Måneskin, está disponível em LP e CD, e também nas plataformas digitais, numa edição da Sony Music.

PS. Se pensavam que iam ler sobre a história das “drogas” ou debates sobre as votações, oops, enganaram-se no texto.

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