Um retrato (entre outros possíveis) do que se escutava no mundo pop em 1982

Está em curso uma nova série de lançamentos temáticos da “Now”. Sob o título genérico “Yearbook” propõem viagens no tempo às memórias pop (e cercanias) de anos concretos. Para já a operação está centrada na primeira metade dos anos 80. Texto: Nuno Galopim

A prática de criar compilações com os êxitos do momento não era novidade quando, em 1983 surgiu uma variação desse mesmo conceito. Porque não juntar mais do que uma editora, aumentando assim o leque de artistas (e de êxitos) que ali se poderiam reunir num disco comum? A ideia nasceu nos escritórios da Virgin Records e rapidamente obteve o sim do responsável de então da EMI. O acordo entre as duas editoras (nessa altura eram entidades separadas) foi assinado num iate de Richard Branson, o “patrão” da Virgin. E para dar nome ao disco foi usada uma frase de um cartaz de publicidade a ovos e bacon (sim, “ovos e bacon”) dos anos 20. Now That’s Waht I Call Music… E a 28 de novembro o volume inaugural da série chegou às lojas.

O formato teve sucesso imediato e o modelo foi somando volume atrás de volume (o mais recente é o 111), tendo depois gerado séries em diversos países, que assim permitiram criar pontos de vista locais sobre a mesma forma de fixar a memória do que foi sucesso, sobretudo em terreno pop (e periferias). Apareceram depois várias edições temáticas, umas por género musica, outras arrumadas por épocas. De resto, em 2022, o mais recente corpo de lançamentos das séries “Now” envolve novos títulos como Now – Seasons in The Sun – 60s and 70s Summer, Now That’s What I Call Pride, Now That’s What I Call 12” 80’s Remixes ou Now That’s What I Call Punk & New Wave. Ao mesmo tempo estão a reaparecer reedições em CD dos volumes originais da série Now That’s What I Call Music. Mas a mais entusiasmante das novas séries em curso é a que se apresenta sob o nome conjunto Yearbook e dedica volumes inteiros às memórias pop de um ano em particular. Na verdade, cada ano está a ser brindado por dois lançamentos, um primeiro com 4 CD, um segundo, com o subtítulo “Extras” com mais 3 CD, arrumando assim memórias de cada ano num total de 7 CD. É uma boa soma. 

Estão já disponíveis edições do Yearbook (mais respetivo “extra”) para os anos 1982, 83 e 84, estando em curso a operação ligada a 1981 (volume Yearbook já editado, com o de Extras agendado para julho).

Olhemos para 1982 como exemplo. Canções como The Look of Love dos ABC, Hungry Like The Wolf dos Duran Duran, Do You Really Want to Hurt Me dos Culture Club  ou Come On Eileen dos Dexys Midnight Runners surgem logo no CD1 do volume 1982 Yearbook. Neste mesmo CD1 encontramos ainda nomes como os Wham!, Abba, Spandau Ballet, Haircut 100, Boa Wow Wow, Madness, The Jam, Fun Boy Three com as Bananarama, Musical Youth, Marvin Gaye, Lionel Richie, Dionne Warwick ou Donna Summer, entre outros mais. O CD junta Paul McCartney em dueto com Stevie Wonder, Kool & The Gang, Shalamar, Malcolm McLaren, Imagination, Patrick Cowley com Sylvester (em tempos os nomes certamente teriam surgido em ordem inversa), Soft Cell, Simple Minds, Tears For Fears, Human League, A Flock Of Seagulls, Visage, Ultravox, OMD, Japan… Pop e r&b até aqui. O CD3 junta um rock de sabor FM com Survivor, J Geils Band, Steve Miller Band, Pretenders, Daryl Hall & John Oates, depois Roxy Music (um pouco fora de tom neste CD3) e uma montra de travo mais indie com Stranglers, Siouxsie & The Banshees, Clash, Altred Image, Associates ou New Order. O CD4 regressa a clima pop com mais Abba, mais Duran Duran, mais ABC, mais Soft Cell, mais Japan, mas também Elton John, Kim Wilde, Blondie, assim como a vendedora da Eurovisão nesse ano, Nicole, com a versão em inglês da sua canção (ou seja, A Little Peace), não faltando a participação britânica dos Bardo, com One Step Further. Pelo meio surgem canções de nomes que o tempo quase foi esquecendo como os Dollar, Tight Fit, Boys Town Gang, Haysi Fantayzee, Clannad ou Mari Wilson.

O volume Extra acrescenta no CD nomes já explorados no volume anterior (Duran Duran, ABC, Soft Cell, Japan, Madness, entre outros) e junta outros como Paul McCartney, Captain Sensible ou Junior. No CD 2 encontramos os Hot Chocolate, Talk Talk, Trio, Thompson Twins, Heaven 17 ou Classic Nouveaux. E no CD3 surge, entre outros, os U2, XTC, Frida, Monsoon, Echo & The Bunnymen, David Sylvian com Ryuichi Sakamoto, Toyah, as Go Go’s, Pat Benatar, John Mallencamp ou a Electric Light Orchestra.

Ao todo são 146 canções, arrumadas em 7 CD guardados em dois volumes. Faltam canções? Faltam sempre, umas por razões contratuais (nem sempre são autorizadas) outras pela curadoria. E num olhar rápido por 1982 sentimos logo a falta de um Billie Jean de Michael Jackson, um 1999 de Prince, um The Message de Grandmaster Flash & The Furious Five, um Last Night a DJ Saved My Life dos Indeep, um Steppin’ Out de Joe Jackson, um Shock The Monkey de Peter Gabriel, um Only You dos Yazoo, um See You dos Depeche Mode, um Safety Dance dos Men Without Hats, um Uncertain Smile dos The The, isto para não falar de um L’Aventurier dos Indochine ou Amor dos Heróis do Mar, já que o ponto de vista das edições da Now (coisa made in UK) é, naturalmente, o mercado britânico. Mesmo assim, e perante a imperfeição de todas as listas e todas as seleções de todas as compilações, convenhamos que é um bom retrato da memória mainstream (sob ponto de vista britânico) do que foi o ano pop de 1982… É verdade que a lógica do êxito decreta uma ditadura de curadoria por aqui. Mas não faz mal a ninguém ter estas janelas de memória como uma forma (possível) de reencontrar peças que construíram a memória coletiva. Neste caso, a de 1982. Foi há apenas 40 anos…

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