Uma caixa de 8 CD conta a etapa, de 1989 a 1993, em que os House of Love gravaram para uma editora multinacional. Contudo, o seu maior contributo para o indie britânico deu-se imediatamente antes, quando arrebataram atenções em 1988. Texto: Nuno Galopim

O grupo nasceu em meados dos oitentas e conta-se que a passagem do vocalista Guy Chadwick por um concerto dos Jesus & Mary Chain representou um episódio determinante na focagem de novos caminhos. Juntou então um grupo de músicos, entre os quais uma guitarrista alemã que marcou presença nos primeiros singles (que mais tarde seriam reunidos num álbum originalmente apenas lançado na Alemanha). Como nome escolheram The House of Love, inspirados pelo livro de Anaïs Nin que entre nós foi traduzido como Uma Espia na Casa do Amor. A saída de Andrea Heukamp reduziu os The House of Love a quatro elementos (e à sua formação de referência), que em conjunto centraram atenções na criação de um primeiro álbum de originais gravado em apenas uma semana de estúdio mas com pós-produção mais longa e algo acidentada.
Editado em 1988 pela Creation Records (que era então uma das etiquetas mais atentas e vibrantes entre o panorama indie britânico), o disco mostrava-se sem título na capa, pelo que acabaria conhecido como, apenas The House of Love. O alinhamento revelava uma impressionante coleção de canções refletindo a determinante influência na redescoberta de um relacionamento da canção com as guitarras levada a cabo pela presença maior dos The Smiths no espaço indie de então. O disco traduzia ainda ecos das memórias fundadoras dos Velvet Underground sendo também evidentes os ensinamentos de um novo melodismo elétrico, de uns Jesus & Mary Chain, entretanto mais polido em Darklands.
O momento em que The House of Love entrou em cena correspondeu a um tempo de uma certa orfandade em terreno pop/rock para guitarras, cenário que era a primeira consequência da separação (ainda recente) dos The Smiths. Entre os nomes “indigitados” pela imprensa musical britânica, sempre com vontade de não deixar tronos vazios, contavam-se os The La’s (que então justificadamente semeavam entusiasmos com o single There She Goes) e os The House of Love. A excelência das canções do álbum de estreia dos House of Love, os arranjos cuidados, o elaborado trabalho de guitarras e a marcante (e tranquila) presença vocal de Guy Chadwick, somadas a uma imagem que cativou atenções colocaram o grupo sob os focos das atenções.
O entusiasmo com que o disco foi acolhido levantou apetites entre outras editoras, acabando a Fontana por chamá-los ao seu catálogo, surgindo então um novo álbum que, com o mesmo título (ou seja The House Of Love) procurava uma lógica de continuidade face ao disco editado pela Creation em 1988. O álbum e respetivos singles (entre os quais uma nova gravação de Shine On) superaram o alcance dos lançamentos anteriores, embora sem o mesmo impacte junto da crítica. Era um mais do mesmo. Bom, é certo, mas em modo mais do mesmo, mesmo assim gerando momentos dignos de ‘best’ of em canções como Never ou Beatles and The Stones. A este primeiro lançamento pela Fontana seguiram-se mais dois álbuns – Babe Rainbow (1992) e Audience With The Mind (1993) – que juntaram à obra do grupo pequenas novas pérolas como The Girl with the Loneliest Eyes ou Crush Me (esta sob ecos de uma nova ordem ritmica). A erosão do encantamento que os acolhera em 1988 tinha entretanto afastado o entusiasmo de uma imprensa que, debalde, continuara a procurar “sucessores” para os The Smiths noutras freguesias. Sem esse fulgor nos textos sobre os seus discos e concertos, e, de facto, sem na realidade grandes novidades maiores na condução dos acontecimentos dentro da sua música, os House of Love esmoreceram e saíram de cena em 1993, ou seja, antes de uma maré de euforia na cena indie britânica (uma vez mais nascida entre a imprensa musical) que daria forma ao brit pop… Regressariam, apenas dez anos depois, embora a milhas do que outrora haviam criado e conhecido, mantendo-se ainda em atividade, apesar da relativa indiferença com que os seus discos têm sido acolhidos fora do círculo de mais intensos admiradores (que ainda os acompanha).
Parte desta narrativa é-nos agora contada numa caixa antológica que junta gravações da etapa em que gravaram pela Fontana Records, ou seja, entre 1989 e 1993. Além dos três álbuns – The House Of Love (o de 1990, conhecido como o “Butterfly Album” dada a imagem da capa), Babe Rainbow (1992) e Audience With The Mind (1993) – os 8 CD juntam três discos de maquetes, raridades e sessões (todos eles sob o título A Spy In The House of Love, recupuperando velhas memórias e um nome usado numa antologia de 1990, e ainda dois discos mais com gravações ao vivo: Leicester Polytechnic (1990), Tasco Warehouse, Londres (maio de 1991) e Malibu Night Club, Nova Iorque (novembro de 1992). Assim se conta, com os detalhes possíveis, a etapa de uma história interessante do indie britânico na viragem dos oitentas para os noventas mas que, contudo, teve o seu melhor capítulo imediatamente antes do que esta caixa nos conta, em 1998.
“Burn Down The World – The Fontana Years 1989-1993”, dos House Of Love, é uma caixa de 8CD editada pela Cherry Red Records.