Joe Silhueta “Sobre Saltos Y Outras Quedas”

Há boas surpresas entre a multidão de discos que o Brasil viu nascer nos últimos meses. E entre os títulos que vale a pena escutar está “Sobre Saltos Y Outras Quedas”, o segundo álbum dos Joe Silhueta. Texto: Nuno Galopim

Em primeiro lugar, talvez os próprios Joe Silhueta… Quem são? A génese do grupo, natural de Brasília, está na dupla formada pelo compositor Guilherme Cobelo (guitarra, voz) e por Gaivota Naves (voz), duo que depois se alargou a um coletivo maior que acabou por integrar Márlon Tugdual (bateria), Carlos Beleza (guitarra e voz), Marcelo Moura (baixo), Lucas Sombrio Muniz (clarinetes e acordeão), Tarso Jones (teclados) e ainda a presença de Tâmara Habka na produção. Do EP de estreia Dylanescas (2016), cujo título desde logo sugere ecos e raízes na cultura folk, o som evoluiu rumo a vistas mais largas e desafiantes no belo Trilhas do Sol, álbum de estreia lançado em 2018 e no qual emergia mais evidente uma puslão indie rock alicerçada em escolas do psicadelismo de outros tempos. Em 2021 primeiros sinais do que seria um segundo álbum começaram a emergir em Tropicalipse, canção que começava por lançar pontes face ao que o grupo antes já apresentara, promovendo o single seguinte, Sobressaltos, uma ideia de eventual evolução na continuidade faz relativamente ao som do álbum de estreia. Contudo, quando finalmente se deu a escutar, na alvorada do verão de 2022, o álbum ao qual chamaram Sobre Saltos Y Outras Quedas destapou um mundo de luminosas surpresas, num alinhamento repleto daqueles raros “sobressaltos” que parecem num primeiro contacto coisa na esfera do caos mas acabam por traduzir uma visão coerente que integra sinais de diversidade e liberdade numa linguagem que se revela capaz de agregar e construir um terreno onde o que diferente encontra um lugar no seio do todo.

Essas marcas de diversidade têm sobretudo a ver com ligações (e eventuais interesses e curiosidades) por vários espaços da história da música brasileira, juntando à folk e ao psicadelismo já antes trilhados toda uma paleta de cores que fazem da escuta do álbum um constante vendaval de sugestões. Veja-se o caso do irresistível Feirará (que abre o alinhamento) que cruza cultura rock com forró, o belo clima jazzy de Suíte 305 (cujo final desenha uma trip de temperos psicalélicos mas também com sabor mpb), numa canção que deve oi seu título ao quarto de hotel em que o compositor Guilherme Cobelo a apresentou, pela primeira vez, aos companheiros. Naco de Nuca começa por lembrar ecos de Bowie e logo depois sugere, pelo som do clarinete, memórias de um outro tempo. Já a Cidade Palavra parece inspirada por escolas pop/rock dos sessentas e O Amor abre alas a frestas de pop (sem esquecer as electrónicas)… E a coisa continua assim, saborosa e inesperada, de canção para canção.

Tal como o recente álbum do coletivo carioca Bala Desejo, embora sob trilhos de referências diferentes, Sobre Saltos Y Outras Quedas traduz um gosto de um grupo de músicos que, conscientes do presente em que vivem, promovem jogos de encontros entre memórias e caminhos que traduzem geografias e épocas da história da música brasileira, no caso dos Joe Silhueta acrescentando às canções uma paleta de liberdade indie que acaba por transcender fronteiras. É um disco saboroso e uma bom exemplo de interessantes novos caminhos do pop/rock de alma “alternativa” que por estes dias se faz no Brasil.

“Sobre Saltos Y Outras Quedas”, dos Joe Silhueta, está disponível nas plataformas de streaming numa edição assegurada pelo próprio grupo (dist. Tratore).

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