Duran Duran “Medazzaland”

Editado apenas nos EUA e Japão em 1997 e assombrado por um momento de quebra de vendas, o álbum “Medazzaland” aproximou o grupo de terrenos indie e tem finalmente edição em CD em solo europeu e surge, pela primeira vez, em vinil. Texto: Nuno Galopim

Se tomarmos Thank You, de 1985, como um desvio pontual na carreira dos Duran Duran, podemos ver o álbum seguinte como o sucessor natural de Duran Duran (ou seja, o Wedding Album), de 1993. E de facto, assim o foi, revelando Medazzaland sinais de uma demanda por uma música feita de estruturas mais complexas, cruzando o labor das electrónicas com o trabalho das guitarras, aproximando o som dos Duran Duran mais das linhas pelas quais caminhavam algumas famílias do pop/rock de matriz indie nos anos 90 que das memórias de uma pop mais luminosa e dançável que pareciam cada vez mais distantes nas suas memórias dos oitentas.

O disco foi de génese difícil, assistindo mesmo a um novo episódio de cisão interna ao confirmar-se a saída do baixista John Taylor, gesto na verdade já indiciado durante a criação do álbum editado em 1993 mas então adiado até este momento. O afastamento de um dos dois fundadores do grupo levou mesmo a novos episódios de trabalho em estúdio e à regravação de vários temas, a sua presença limitando-se no fim a apenas quatro canções do alinhamento final.

Uma primeira amostra do som de um novo disco emergiu em março de 1997, com a edição em single de Out of My Mind, uma canção mid tempo de cenografia intensa e sumptuosa, criada para a banda sonora do filme O Santo, de Philip Noyce, revelando ainda o single os novos temas Silva Halo (mais experimental e minimalista na sonoridade, e que seria recuperado para o alinhamento do álbum) e Silver or Saint (também gravado para a banda sonora do filme). O single mostrava os próprios Duran Duran a garantir a produção, assumindo depois a dupla TV Mania (ou seja, Nick Rhodes e Warren Cuccurull) o mesmo trabalho no álbum a que chamariam Medazzaland, título inspirado pela semelhança do nome de um medicamento que Simon Le Bon tomara por ocasião de um tratamento dental e que lhe sugerira experiências quase alucinogénicas.

O segundo aperitivo surgiu em setembro do mesmo ano com Electric Barbarella, uma canção pop mais luminosa, representando aquela que era, desde a pausa de 1985, a mais direta evocação de memórias dos caminhos seguidos pela música em inícios dos anos 80. A canção, que foi então a primeira a ser vendida pela Internet por download, abria as portas a Medazzaland, que chegaria pouco depois.

O álbum confirmava um aprofundar de caminhos sugeridos no Wedding Album, explorando um trabalho de arranjos mais intenso e complexo, ensaiando experiências por novos terrenos, assimilando entre outras heranças as do psicadelismo ou da música indiana (Talvin Singh, nas tablas, é um dos convidados), num corpo de canções que se revelaria o mais inspirado e suculento da obra do grupo nos anos 90. Canções como Big Bang Generation (um potencial single), Buried in The Sand ou o beatlesco Midnight Sun mostravam uma banda reinventada em solo indie sem, contudo, abdicar das suas marcas de identidade. Ao mesmo tempo Michael (You’ve Got a Lot to Answer For), dedicada a Michael Hutchence, assinalava um possível sucessor de Serious (e outro potencial single). Já Be Me Icon ou So Long Suicide (em memória de Kurt Cobain) prolongavam as experiências mais elétricas encetadas em Liberty, porém com outros resultados. O tema-título, que abre o alinhamento, revelou a estreia vocal de Nick Rhodes, num registo spoken word sobre um instrumental que lança claramente os caminhos pelos quais a música do disco depois evolui.

As fracas vendas obtidas no Japão e EUA, onde o álbum foi lançado em primeiro lugar, conduziram a um adiamento da sua chegada aos mercados europeus, que acabaria por nunca se concretizar, ficando o disco apenas confinado a edições físicas nesses dois primeiros territórios. Mais tarde surgiu um lançamento digital, mantendo-se todavia este como um dos raros episódios na discografia do grupo sem representação física na Europa, estatuto que agora muda. Vinte e cinco anos depois eis que finalmente o disco é editado em mercados europeus, tanto no suporte de CD como numa primeira edição em vinil, esta surgindo no formato de duplo LP, com um booklet que recupera todo um trabalho gráfico que sublinha o tom mais desafiante que o disco propunha em 1997.

“Medazzaland”, dos Duran Duran, está disponível em 2LP e CD num novo lançamento Tape Modern/BMG.

2 pensamentos

  1. O Thank You não foi um desvio temporário. A meu ver, foi o deslize que matou irremediavelmente o momentum do comeback que o Wedding Album tinha reconstruído e que nem os próprios provavelmente sonhariam que sucedesse.
    Ainda hoje acho que, a ter saído logo em 1995, o Medazzaland iria cimentar o retorno dos Duranies ao primeiro plano. E, quem sabe, hoje em dia, se eles não seriam uma banda, pelo menos, ao nível dos Depeche, na arena dos circuitos de música ao vivo – leia-se: (quase) ao nível dos gigantes do rock clássico ou de uma Madonna. Valia a pena pensar nisto, creio.

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    1. O Thank You tem momentos bem interessantes. Mas, de facto, o ‘momentum’ pedia mais um EP de versões… E o belíssimo ‘Medazzaland’ logo depois. Mas foram tempos complicados e hoje ajudam a escrever parte de uma história que leva já mais de 40 anos de vida e que mostra uma banda que soube resistir à passagem do tempo e que chegou com músculo criativo à idade da veterania, como o ‘Future Past’ tão bem o mostra.

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