A génese da pop eletrónica está em foco em “Listening to The Music The Machines Make”, livro de Richard Evans que narra a história de acontecimentos e discos num arco entre 1978 e 1983, exaustivo a ler arquivos mas de vistas curtas nas geografias observadas. Texto: Nuno Galopim

São cerca de 500 páginas com um relato (muito) detalhado que envolve nomes e discos que fizeram a história da génese da pop eletrónica num arco de tempo entre 1978 e 1983, com um prólogo que evoca 1977 e um epílogo que arruma os passos imediatamente posteriores, ocorridos em 1984. Com o subtítulo “Inventing Electronic Pop 1978 – 1983” e assinado por Richard Evans, o criador do blogue “Remember The Eighties” (que depois se transformou em “This is not Retro”), o livro apresenta uma história dos principais protagonistas desta aventura, sobretudo no Reino Unido e Estados Unidos, abrindo apenas muito breves frestas de atenção por casos continentais como os belgas Telex ou os suíços Yello além, sem surpresa, os alemães Kraftwerk ou os suecos Abba. Deixando, afinal, muita gente (e discos) de fora… Fosse o sub-título qualquer coisa como “a história da pop eletrónica no Reino Unido” e a coisa passava menos mal…
A história é contada recorrendo sobretudo a material de arquivo (sobretudo os jornais e revistas sobre música made in UK por aqueles dias), juntando algumas entrevistas expressamente realizadas para o livro. O tronco dos acontecimentos está todavia centrado numa sucessão exaustiva de factos, com referências aos singles e álbuns editados, as respetivas performances nas tabelas de vendas no Reino Unido e excertos das críticas então apresentadas nas mais diversas publicações. Esta presença das críticas recuperadas de velhas páginas torna-se por vezes fastidiosa e define rotinas que se repetem depois capítulo após capítulo, superando a caracterização dos cenários macro ou um storytelling de vistas (geográficas) mais largas que fica a faltar.
O livro é dividido em partes, correspondendo cada qual a um ano (1978, 79, 80, 81, 82 e 83), dividindo depois os capítulos de cada segmento por nomes com afinidades entre si e que editaram discos ou escreveram páginas da sua história nesses intervalos de tempo. Aqui encontramos, assim sendo, um retrato detalhado de factos e, sobretudo, discos editados neste período por nomes como os Human League, Cabaret Voltaire, Joy Division, Tubeway Army (e, depois, Gary Numan), Devo, David Bowie, OMD, Throbbing Gristle, The Normal, Fad Gadget, Simple Minds, Sparks, Buggles, Ultravox, Japan, Spandau Ballet, Landscape, John Foxx, Visage, Duran Duran, Depeche Mode, Yazoo, B.E.F., M, Heaven 17, Soft Cell, DAF, Robert Palmer, Laurie Anderson, Blancmange, Pete Shelley, New Order, Grandmaster Flash, Afrika Bambaataa, Arthur Baker, Wodini, Thomas Dolby, Assembly, Eurythmics ou Frabkie Goes To Hollywood, entre alguns mais. Há referências importantes às grandes transformações nos media, como o aparecimento de publicações como a The Face ou i-D ou a estreia da MTV. Questões laborais, como os receios de algumas instituições perante o surgimento de novas ferramentas electrónicas, estão igualmente referidas. Mas, num livro de 500 páginas sobre a génese da pop electrónica convenhamos que o autor tropeça apenas nos nomes óbvios e não junta muitos que, mesmo tendo assinado notas de rodapé na génese da pop eletrónica, fazem também parte desta história. Nomes talvez menos mediáticos, mas expressão dos sinais dos tempos como uns Berlin Blondes, New Musik ou uns Dramatis fazem falta, assim como os esquecidos Shox (que integraram os quatro singles de estreia da 4AD em 1980). São momentos que juntariam pistas de detalhe a uma história que, mesmo ocupando 500 páginas, deixa elementos por contar… Falta uma presença condigna da Yellow Magic Orchestra e dos seus três elementos, assim como olhares sobre os primórdios da cena hi-nrg (Patrick Cowley, Sylvester, Bobby Orlando), isto sem falar nos franceses Taxi Girl, Lio (na verdade uma cantora luso-francesa), Indochine, Etienne Daho ou até Jean Michel Jarre, nos espanhóis Mecano, nos alemães Nena ou Zeus (que se tornaria um produtor com notoriedade), no grego Vangelis… E convenhamos que os tugas Da Vinci, Ópera Nova ou Heróis do Mar, também podiam ser chamados a um olhar de meio milhar de páginas sobre a génese da pop eletrónica, assim como cenas electrónicas locais (como a que emergiu em várias repúblicas da URSS, América Latina, África, etc..). Mas o Canal da Mancha é sempre um filtro difícil de vencer para quem escreve sobre música pop a partir da Velha Albion… E acabamos com um livro que, mesmo juntando muito útil informação sobre bandas, discos (e críticas então publicadas), não nos conta, com uma visão mais ampla, a história que promete contar. Em 500 páginas cabia muito mais…