Jean Michel Jarre “Equinoxe” (1978)

As críticas da imprensa musical da época não foram lá muito favoráveis a “Equinoxe”. Mas, 45 anos depois, vale a pena notar que está aqui um importante marco na construção de um percurso e até uma referência maior nas origens do ‘space disco’. Texto: Nuno Galopim

No início de 1978 Jean Michel Jarre estava novamente em estúdio com o objetivo de criar um quarto álbum a editar em nome próprio. Trazia consigo a memória recente do enorme sucesso obtido por “Oxygène” (editado em 1976) e, desse impacte, o dilema entre o desejo natural de seguir uma evolução em continuidade e a vontade em não repetir o que havia fixado nesse disco que, ao invés dos dois anteriores, havia colocado o seu nome no mapa das atenções. Entre factos da sua vida pessoal e um significativo aumento da “maquinaria” que chamara ao seu espaço de trabalho, a velha cozinha na qual antes tinha instalado o seu estúdio não podia mais acolher este novo desafio, surgindo então nova casa e novo local (uma antiga garagem) como espaço de trabalho no qual, durante semanas a fio, e com a ajuda de um gravador de 16 pistas (em segunda mão) foram surgindo aos pouco as peças que começaram a dar forma a nova música.

A vontade de retratar o percurso de um dia, do despertar ao deitar, desenhou o arco maior da narrativa de novo ciclo instrumental, definindo a estrutura central de uma ideia que juntou ainda referências colhidas no cinema, aqui procurando pistas tanto em Kubrick (sobretudo no clássico “2001: Odisseia no Espaço”) como em Fellini (que se manifestaria por exemplo em “Equinoxe – Part 8”, tema por vezes também referido como “Band on The Rain”). 

Tal como em “Oxygène” a música que ganharia forma com o título “Equinoxe” definiu um corpo maior dividido em partes (oito desta vez)., A música emerge em tons ambientais, desenhando cenários, nas partes 1 e 2, seguindo-se uma transição na terceira, que abre caminho aos momentos pop mais exuberantes que surgem precisamente a fechar a face A e a abrir o outro lado do vinil. Sem surpresa os dois singles extraídos do álbum corresponderiam a “Equinoxe – Part 5” (ainda em 1978) e “Equinoxe – Part 4” já em 1979, havendo mais adiante um terceiro 45 rotações com música deste disco, porém em gravações ao vivo feitas na Praça da Concórdia, em 1979, naquele que foi então o primeiro con certo de grande escala de Jean Michel Jarre (nesse single, “Jarre à La Concorde”, escutamos as partes 7 e 8). A sequência ritmicamente mais intensa aberta na parte 4 tem continuidade nas pulsastes partes 6 e 7, chegando o desfecho, chuvoso (com sonoplastia) na já acima citada faixa de encerramento com alma felliniana. 

Apesar das sovas que o disco colheu – sobretudo numa imprensa musical de genética roqueira que levou anos para conseguir escutar sem preconceitos as formas emergentes da música eletrónica – “Equinoxe” resistiu à passagem do tempo e ganhou, juntamente com “Oxygène” e o sucessor “Les Chants Magnetiques” (1982) um lugar de relevo numa trilogia que fixou as bases de uma linguagem que ajudou a cimentar marcas de autor entre os pioneiros de uma etapa de aproximação das electrónicas à música popular. Carl Sagan estava atento e levou alguns momentos do disco para a banda sonora da série “Cosmos”, apesar de o disco respectivo não os representar nos alinhamento. Hoje, 45 anos depois, “Equinoxe” é entendido como um momento marcante na definição do chamado “space disco”, definindo um caminho ao qual o próprio Jarre regressou anos depois quando, em 2018 criou uma sequela à qual chamou “Equinoxe Infinity”.

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