Depeche Mode “Memento Mori”

Primeiro lançamento do grupo após a morte de Andrew Fletcher (a quem o disco é dedicado), “Memento Mori” revela, num programa feito entre heranças naturais e projeções possíveis de rumos futuros, o melhor disco dos Depeche Mode desde “Ultra”. Texto: Nuno Galopim

A morte inesperada de Andrew Fletcher, em maio do ano passado, marcou de forma profunda a génese, o mood e as canções que agora emergem no alinhamento de “Memento Mori”, o 15º álbum de estúdio dos Depeche Mode. Já com canções escritas e algumas maquetes gravadas quando a notícia se soube, o álbum (no qual não ficou registada nenhuma contribuição de Fletcher, a quem o disco é dedicado) acabou por traduzir um reencontro do grupo com a sua faceta mais assombrada, alma que em tempos ficara fixada nas canções do magnífico “Black Celebration” (1986) e que agora ganha todo um novo corpo de significados, da noção de perda (que a morte de um amigo e companheiro tão claramente manifesta) e de mortalidade a outras fragilidades da existência. 

Revelado por “Gosts Again”, o mais cativante de todos os singles de avanço para um novo álbum dos Depeche Mode em largos anos, o álbum “Memento Mori” traduz por um lado uma vontade em encontrar pontes de comunicação com as raízes electrónicas do som do grupo nos oitentas (antes portanto das contaminações americanas que chegaram com o final da sua primeira década de vida), mas não abdica das demandas cénicas mais elaboradas que a sua música conquistou mais adiante, traduzindo na verdade um dos alinhamentos com mais apetite pela diversidade de sons e formas na obra recente do grupo e onde curiosamente cabe uma das mais kraftwerkianas de todas as criações da banda (escutem-se alguns dos sons usados em “People Are Good” e o minimalismo que define grande parte do corpo da canção). Do classicismo de “Soul With Me” (na linha das grandes canções que o próprio Marting Gore foi juntando a cada álbum) às paisagens exploratórias de um “My Cosmos Is Mine”, o álbum que abre uma nova etapa na obra do grupo (agora um duo) lança possibilidades. Caminhos novos que ora vão de uma nova parceria criativa de Gore com Richard Butler (ex-Psychedelic Furs) e que traduzem ecos de trabalhos lançados durante a pandemia, até à constatação de uma cada vez maior solidez da escrita de Dave Gahan (como se escuta no magnífico “Before We Drown”).

Deixando de lado uma veia mais política que caracterizara o anterior “Spirit”, o novo “Momento Mori” devolve os Depeche Mode a um território mais próximo das linhas centrais da sua obra desde que, em 1982, Vince Clarke, deixou o grupo para formar os Yazoo (curiosamente, tal como agora os Depeche Mode, um duo). E se por um lado uma tragédia pessoal será inevitavelmente associada à criação deste disco, por outro representa o melhor álbum que editam desde aquele difícil “Ultra” (1997) nascido em tempo de várias convulsões internas (entre as quais as que ditaram a saída de Alan Wilder). 

“Memento Mori”, dos Depeche Mode, está disponível em LP, CD e nas plataformas digitais numa edição Sony Music

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