Uma versão inédita de “The Man Who Sold The World”, registada para a BBC em 1997, surge no mesmo dia em que são anunciados um EP digital e um álbum novo com música de David Bowie. Texto: Nuno Galopim

Habituámo-nos a receber surpresas nos dias de aniversário de David Bowie. Foi a 8 de janeiro de 2013, por exemplo, que escutámos Where Are We Now?, acolhendo então a notícia de que, após dez anos de silêncio, haveria em breve um novo álbum de David Bowie… Depois de nos ter deixado, em janeiro de 2016, dele continuámos a ter “presentes” a cada 8 de janeiro que passa. E em 2020 o dia 8 de janeiro, que corresponderia ao seu 73º aniversário, mostra-nos uma gravação inédita e a revelação de dois lançamentos.
Um dos lançamentos é digital. Trata-se do EP David Bowie Is It Any Wonder e incluirá seis gravações raras e inéditas, que surgirão nas plataformas ao ritmo de uma faixa por semana.

O outro disco é um álbum de nove temas. Terá por título ChangesNowBowie e surgirá em edições limitadas em LP em vinil e em CD por ocasião da edição de 2020 do Record Store Day, que está agendada para o dia 18 de abril. O álbum vai apresentar o registo de uma sessão que David Bowie gravou para a BBC para celebrar o seu 50º aniversário, a 8 de janeiro de 1997. No programa, além das canções, Bowie recebeu mensagens e perguntas de nomes como os de Scott Walker, Damon Albarn, Robert Smith ou Bono, entre outros.
Nessa sessão Bowie contou em estúdio com as presenças de Gail Ann Dorsey (baixo, voz), Reeves Gabrels (guitarras) and Mark Plati (teclas e programações). Um dos temas gravados nessa sessão (que corresponde também ao primeiros tema revelado do alinhamento de David Bowie Is It Any Wonder, é uma versão de The Man Who Sold The World, a canção que deu título ao seu terceiro álbum, editado em 1970.
Podem escutar aqui:
A canção surgiu na reta final da gravação do álbum que depois ostentaria o seu nome como título. A voz foi registada a 22 de maio de 1970 e a composição não teria então mais de 15 dias, como relata Tony Visconti na “bíblia” Bowie de Nicholas Pegg. E até conhecer as palavras que Bowie registou naquele dia em estúdio, a canção teria como título de trabalho Saviour Machine.
Sobre o significado das palavras a coisa, como sempre em Bowie, está carregada com mais possibilidades do que certezas. Em 1997 ele sugeriu que se tratava de uma manifestação de busca de identidade, tão característica das fases tardias da adolescência. Na biografia Alias David Bowie, Peter Gillmans sugere, contudo, que possa ali haver ligações com o poema Strange Meetinf, de Wilfred Owen, no qual o narrador é confrontado com o encontro com o soldado inimigo que matou no campo de batalha…
Tal como sucedeu com o álbum, a canção começou por ter uma existência discreta em 1970. Três anos depois conhecia nova vida no lado B de uma edição em single de Life On Mars (que na verdade era já uma canção com dois anos de vida por essa altura). The Man Who Sold The World só cativou atenções maiores quando Lulu gravou uma versão da canção em 1974, tornando-a um êxito. Cinco anos depois Bowie reclamou protagonismo na história de The Man Who Sold The World ao apresentar uma versão da canção no programa de televisão Saturday Night Live, acompanhado então por Klaus Nomi e Joey Arias. Já nos anos 90 a canção conheceu novo surto de atenções com a versão (acústica) incluída na sessão dos Nirvana para o programa MTV Unplugged.
Nas passagens pelo palco de David Bowie The Man Who Sold The World foi presença regular em algumas digressões e atuações nos anos 90 e já no século XXI. Escuta-se na atuação para a BBC no ano 2000 incluída no disco bónus de Bowie at The Beeb, esteve no alinhamento da Reality Tour (a última digressão de Bowie) e integrou o musical Lazarus.