Oito anos depois de “Out Of The Game”, e vividas entretanto experiências entre a ópera e a criação de música para sonetos de William Shakespeare, eis que “Unfollow The Rules” assinala um reencontro do músico com o terreno onde brilha mais (e melhor). Texto: Nuno Galopim
Caminhar entre vários moods e mundos não é coisa inédita na carreira de Rufus Wainwright… E basta lembrar a homenagem festiva a um concerto célebre de Judy Garland ou a melancolia que dominava o ciclo All Days are Nights: Songs For Lulu para termos exempos da campos distantes vividos por uma mesma voz. Nos últimos anos vimos Rufus Wainright a dar espaço a outros desejos e ambições e a fixar-se, sobretudo discograficamente, em terrenos mais distantes da canção pop. Estreou duas óperas (uma delas entretanto levada a disco pela Deutsche Grammophon), fez música para sonetos de William Shakespeare… É certo que nunca deixou de andar pela estrada… E aí era, contudo, a força de grandes canções pop (sobretudo as que tinha editado em disco na primeira década do século XXI, em álbuns como Poses, o díptico Want e Release The Stars), que ancoravam os melhores momentos dos espetáculos que ia apresentando. Isto sem esquecer, naturalmente, a arte de estar em palco e usar as palavras e o bom humor, para deixar a plateia invariavelmente seduzida. Há dois anos o single Sword Of Damocles, com uma evidente carga política, dava um primeiro sinal de reencontro com a canção pop, seguindo caminhos consideravelmente distantes do travo 70’s do álbum Out Of The Game, de 2012… Durante as semanas em que, já este ano, vivemos em confinamento, Rufus Wainwright apresentou diariamente (online) um programa de canções ao vivo, desde sua casa (e em roupão). A principal novidade era, de vez em quando, a estreia de uma ou outra das canções de um disco novo que tinha agendado para abril e acabou por ser adiado para este verão. Apenas ao piano, ao vivo e em direto, a coisa prometia. Mas agora, com Unfollow The Rules já editado, a coisa ainda soa melhor… O “velho” Rufus dos dias pop está de volta!
Com o alinhamento dividido em três partes (a versão em vinil ocupa três faces de um LP duplo), Unfollow The Rules é um evidente retomar de uma relação com a canção pop que Rufus Wainwright começou a dedilhar logo na sua promissora estreia em 1998, mas que, depois do aclamado Poses (de 2001), alcançou um patamar de exuberância sinfonista tanto nas duas partes de Want como em Release The Stars. Tal como nesses discos a escrita serve para retratar quer o seu universo particular – há uma canção sobre a vida doméstica (Peaceful Afternoon) e, uma outra sobre a sua filha (My Little You) – mas também reflexões que nascem das suas vivências profissionais e contactos com aqueles que o acompoanham ou reflexos do mundo ao seu redor. Se este sentido confessional e vivencial na verdade cruza toda a sua obra, na verdade o que mais brilha em Unfollow The Rules é o modo como estas narrativas e olhares reencontram uma escrita que conhece o poder da sua assinatura vocal e, mais ainda, aceita novamente a libertação do sentido de cor, espaço e volume que Rufus explorara já nas suas melhores (e menos contidas) canções pop… Que bom que é poder voltar a escutá-lo no terreno em que brilha mais. E entre o fulgor de Devils and Angeles (Hatred), a elegância grandiosa dos arranjos de This One ‘s For The Ladies (That Lunge!) ou o lirismo do tema título, há aqui canções ao nível das melhores da obra de Rufus Wainwright. Belo regresso a “casa”!
“Unfollow The Rules”, de Rufus Wainwright, está disponívelm em 2LP, CD e nas plataformas digitais numa edição da RCA.
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