Aos 41 anos de vida, os suíços Yello apresentam em “Point” não só o seu melhor álbum desde finais dos anos 80, como nele lançam sinais de vontade em continuar a explorar, sem repetições, os trilhos então vividos nos seus melhores dias. Texto: Nuno Galopim

Estará a acontecer aos veteranos da música eletrónica nascidos entre finais dos anos 70 e a primeira metade dos 80 o mesmo que, há uns anos, vimos acontecer com momentos de franco reencontro com os seus melhores dias de um Bob Dylan ou Johnny Cash, depois de uma travessia de tempos vividos sob atenções menos intensas? É possível. E os novos discos dos Erasure e Yello, ambos representando os seus melhores em três décadas, e aos quais brevemente se poderá juntar um regresso dos Cabaret Voltaire (agendado para novembro), ajudam aquela visão da criação da música pop(ular) como um fenómeno de maior viço na juventude… O passar do tempo abre outras possibilidades. E desde os mais recentes álbuns dos OMD ao álbum que os Depeche Mode lançaram em 2017 (e que é o seu melhore desde 2001) a estes novos exemplos, o presente parece mostrar que, às novas gerações de exploradores, os veteranos têm um papel a dizer na canção eletrónica do presente (mesmo que entre eles não esperemos a criação de novas visões ou revoluções).
Falemos dos Yello. Formados na Suíça em 1979, e durante uma curta etapa integrando Carlos Perón, são um duo constituído por Boris Blank e Dieter Meier. Desde cedo encontraram nas eletrónicas as ferramentas para criar uma pop animada por uma intensa pulsão rítmica, angulosa, sincopada, acompanhada por sabores que vão de ocasionais piscadelas de olho à cultura latina a expressões de um nonsense e bom humor, ingredientes com os quais talharam uma personalidade que, mais de 40 anos depois, se mantém firme e distinta, como uma boa região demarcada o pode fazer.
É verdade que nos anos 90 começaram por tentar repetir ecos da sua música (o álbum Baby é disso um exemplo), antes de partirem em busca de outras soluções, embarcando então numa sucessão de títulos sempre competentes mas então incapazes não apenas de repetir os patamares de notoriedade dos álbuns editados nos anos 80, como revelando sugestões que não conseguiram nunca desviar atenções de novos peões do mesmo jogo que entretanto tinham conquistado os seus lugares ao sol… Apesar de nunca terem parado (e a dada altura aberto espaço para carreiras a solo em paralelo), reduziram o ritmo criativo com a viragem do milénio, revelando em Touch Yello (de 2009) primeiros sinais de um possível renascimento que ganhou mais intensidade em Toy (2016), o disco que claramente lança as bases para o salto (feliz) que agora se revela em Point, claramente o melhor disco dos Yello desde Flag (1988).
Waba Duba, o single de avanço, era uma clara recuperação do modelo de canção que lhes deu clássicos como Goldrush, Oh Yeah ou The Race… O sentido clássico de gestão dos ritmos, o gosto pelos ocasionais pontuados jazzy e funk, o canto sussurrado e muito teatral de Dieter Meier lançam depois, sobre todo o alinhamento, as marcas de identidade clássicas, sobre as quais as eletrónicas de Boris Blank aprofundam uma demanda mais minimalista e angulosa, que Toy já levantara mas que aqui abraçam o todo, conferindo ao alinhamento características de corpo bem definidas, retomando assim o modo como, entre álbuns célebres como Stella (1985) ou One Second (1987), os Yello tinham desenhado e solidificado a criação de uma linguagem única. Point é, desde finais dos oitentas, o álbum que mais bem lida com essas heranças (afinal de tudo, o puslar do seu coração), encontrando para com elas dialogar uma bela mão-cheia de novas canções e dotando depois o conjunto de marcas que fazem com que, mesmo num tronco comum, não estejamos perante mais do mesmo… Um pouco como os Duran Duran fizeram em All You Need Is Now (2010) e Paper Gods (2015), em Point os Yello resolvem finalmente dar continuidade aos caminhos que exploravam nos seus dias de glória. Nada contra. Antes pelo contrário.
“Point” dos Yello está disponível em CD, LP e nas plataformas digitais numa edição da Polydor.