40 anos depois dos primeiros passos que o grupo alemão deu em Dusseldorf, onde nasceu, uma reativação do grupo com parte da formação clássica, mas nome ligeiramente diferente, tentou criar o sucessor do mítico “A Secret Wish”. Texto: Nuno Galopim

Há discos capazes de inscrever na história a afirmação de um espaço tão único e pessoal que, mesmo que os seus autores tenham assinado uma obra curta, esse momento fica eternamente marcado como um episódio de exceção capaz de fixar não só marcas do seu tempo e da identidade de quem o fez como resistir depois à passagem dos anos. Foi de certa maneira isto o que aconteceu com o álbum que, em 1985, nos apresentou os Propaganda e que, ao mesmo tempo, representava, depois de primeiros discos dos The Art of Noise e Frankie Goes To Hollywood, a afirmação da solidez de uma ideia plástica (mas também de comunicação) que então colocava no mapa a linguagem pop da ZTT Records.
A Secret Wish, ao qual podemos juntar as edições em 45 rotações dos singles Dr Mabuse, Duel e P-Machinery, assim como o álbum de remisturas que depois encerrou este capítulo, é um monumento que encerra uma visão para música pop que usava as possibilidades das novas electrónicas e técnicas de estúdio em favor de canções de uma dimensão maior, épica, que desenhou um teatro de sons sem par. A fragmentação do grupo chegou pouco depois, com a vocalista Claudia Brucken a partir para depois formar a dupla Act (com Thomas Leer) e os restantes elementos a criar um segundo álbum que em nada soube herdar a excelência do primeiro. Os Propaganda ficaram assim inevitavelmente associados à memória do álbum de 1985, devendo-se de facto à ideia pop ali fixada a construção de um episódio de referência que o tempo não esqueceu.
Formados em Dusseldorf em 1982, inicialmente com o ex-Krupps Ralf Dörper como primeiro timoneiro, alargaram depois a formação e mudaram de casa para Londres, entrando em cena em tempo de afirmação da editora ZTT Records. Agora, 40 anos depois dos primeiros passos, a cantora Claudia Brücken e Suzanne Freitag (que estava a bordo desde os primeiros passos) juntam-se para procurar criar o sucessor de A Secret Wish que 1 2 3 4 não soube ser. Para evitar debates legais com o nome apresentam-se como xPropaganda e, em busca das heranças naturais do som de 1985, convocam novamente o produtor Steve Lipson.
Contudo, apesar das estratégias de mimetismo (no som, nas formas, nos ambientes) e de alguns momentos agradáveis (sobretudo nas canções que precederam o lançamento do álbum), nunca The Heart is Strange parece conseguir mais do que propor uma tentativa de reativação um mito. O reencontro, mesmo que tecnicamente competente e com canções que não envergonham ninguém, não oferece contudo mais do que eventuais sugestões de nostalgia (que a própria edição via ZTT veicula). Ao invés do novo disco dos Soft Cell, esta proposta de um presente demasiado agarrado a ecos do passado não relativa de todo o valor da memória da marca que está no epicentro desta reativação.
“The Heart is Strange”, dos xPropaganda, está disponível em vários suportes físicos e digitais, numa edição da ZTT.
Primeiro que tudo: bem vindo de volta à postagem mais habitual. Esperamos e desejamos que seja para manter, dentro do possível.
Propaganda, então – ou melhor, xPropaganda. Antes de mais, não ouvi o disco; por isso, não me vou manifestar sobre a sua qualidade ou não. No entanto, o pormenor do x (ou “ex”, para quem eventualmente não tenha apercebido), pela experiência que eu tenho de aventuras anteriores similares, levanta já uma potencial bandeira vermelha. Quando uma pessoa se lembra de um certo disco chamado No Talking, Just Head ou de coisas como os Black Star Riders ou os Beady Eye (leia-se: respetivamente, o que restava, a certa altura dos Thin Lizzy ou dos Oasis), é o suficiente para partir para uma coisa destas já com grandes precauções. No fundo, por muito que queiramos ser benevolentos, a sensação de que estamos perante uma espécie de versão “marca branca” do produto original não deixa de lá estar, mesmo antes de ouvir sequer um som que seja. E isto vem de alguém que não tem problemas nenhuns em comprar marcas brancas quando vai ao supermercado – em bastantes casos, já estamos no ponto em que nem sequer existe diferença de qualidade. No que à música diz respeito, no entanto, a atitude geral (já reparei que não é só minha) ainda continua a ser de querer o original e não aceitar qualquer espécie de substituto. O que se compreende perfeitamente. Mas não deixa de ser curioso, seja como for.
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