Depois de refletir sobre o terrorismo e a guerra em dois discos nos quais usou a voz já depois da viragem do milénio, Brian Eno regista em “Foreverandevernomore” o seu álbum vocal mais consequente desde os quatro discos de canções que fez nos anos 70. Texto: Nuno Galopim

Apesar do ritmo com que lançou os seus primeiros discos vocais na década de 70, com quatro álbuns editados entre 1973 e 1977, Brian Eno focou depois a maior parte dos seus esforços na criação de música instrumental e na exploração de parcerias com outros músicos (muitas vezes no papel de produtor). Ocasionalmente a voz voltou a tomar um papel de maior relevo na sua discografia, como sucedeu em discos criados em conjunto com John Cale ou David Byrne, e em episódios pontuais da sua própria discografia, alguns deles surgindo já depois da viragem do milénio, como foram os casos de Another Day On Earth (2005) ou The Ship (2016). E entre estes dois discos surgiam olhares mais críticos sobre o mundo atual, atitude que agora revela ser o tutano temático de Foreverandevernomore, um novo disco no qual Brian Eno volta a assumir o papel de vocalista.
Musicalmente mais próximo dos passos ensaiados em The Ship do que na memória dos seus clássicos discos pop/rock dos anos 70, Foreverandevernomore revela-se num lugar onde confluem não só ideias colhidas nas experiências de já mais de 40 anos daquilo a que se convencionou chamar “música ambiental”, mas também uma vontade em trabalhar a voz de forma diferente, isto sem esquecer a dimensão do homem atento ao mundo que desenha aqui o disco mais assombrado (mas nem por isso menos realista) da obra de Brian Eno.
Foreverandevernomore, que viu algumas das suas canções a conhecer primeiros sinais de vida no concerto que Brian Eno deu em conjunto com o irmão Roger na Acrópole, em Atenas (Grécia), propõe uma experiência envolvente, cinematográfica e desafiante nos sons (por vezes com elementos angulosos ou desconfortáveis a impedir que os ambientes desenhados sejam um pano de fundo), definindo na música uma tela tranquila, mas tensa, sobre a qual Brian Eno reflete sobre sinais de perigo que assinala no mundo do nosso tempo. Das catástrofes ambientais aos focos de conflito nasce então o guião algo desencantado que nos acompanha ao longo de todo o disco. Apesar das diferenças evidentes, entre a forma de trabalhar os rumos da voz e o desenho doc climas, parece haver aqui uma busca de um sentido de liberdade formal que Scott Walker procurou na sua obra tardia, porém sem a intensidade quase carnal que a música dos seus últimos discos traduzia. É que, mesmo assombrado pelos rumos que toma o mundo ao seu redor e de um certo ceticismo que revela ao contemplar possibilidades que o futuro pode guardar, Brian Eno não deixa aqui de manter vivo o tom eloquente pelo qual sempre expressou a sua identidade como artista.
“Foreverandevernomore”, de Brian Eno, está disponível em LP, CD e nas plataformas de streaming, numa edição Opal Records / UMC